sábado, 24 de dezembro de 2011

HISTÓRICO DAS ESCOLAS CAIO MARTINS - (SEM DATA)

História
Filosofia
Estrutura
Ação
Destino

- UMA IDEIA –
As escolas CAIO MARTINS nasceram de um ideal relacionado com a formação do homem a serviço da ordem. Propunham-se à prática de atividades capazes de modificar o comportamento convencional, isto é, a velha praxe da repressão e da vigilância dos atos anti-sociais. E, pretendiam assim realizar obra pioneira, diferente de tudo quanto, até então, se havia intentado, no delicado campo em que iriam atuar. Em síntese era a substituição paulatina do vigiar e reprimir pelo educar e assistir.
A meta seria atingida através da convivência dos servidores da Policia Militar com o fator embrionário dos delitos - a criança desamparada ou simplesmente necessitada de recursos capazes de lhe permitirem uma adequada formação da personalidade. A idéia teria sua fecundação no encontro do servidor da causa pública – o soldado – com aquele que seria, por diante, objeto de suas atenções e cuidados.
Eis quando se verifica o confronto de duas realidades objetivas geradoras de uma resposta, que haveria de conferir à obra um programa e uma filosofia.
- UMA FILOSOFIA –
Tão logo chamado à nobre missão assim proposta, verificou o miliciano, transformado em educador, que a tarefa não se resumiria no simples esforço de prover alimento e agasalho a quem não desfrutava desses bens materiais. Tratava-se de empresa complexa, a exigir, para a composição do programa global de resposta a necessidades, muito variadas, específicas, e reais, de um esforço bem maior e mais inteligente do que se poderia imaginar de início.
A criança no lar confere responsabilidade de uma programação plástica, de modo a construir com a imensa gama das solicitações da personalidade, o modelo da escola que a ciência pedagógica há anos persegue e só nos dias que correm emerge no painel das aspirações humanas.
- PROGRAMA DE AÇÃO –
A ação da entidade nascente deveria incidir nesta ordem de pensamento, já agora transformando em programa. Ultrapassado ficou o elementar cuidado visando sanar carências materiais apenas, quase sempre filhas de desajustamentos sócio-econômicos. Essa preocupação cedia lugar a outra de conteúdo dirigido ao atendimento da personalidade, portadora muitas vezes, em suas origens, de lastros negativos a serem pensados, estudados e corrigidos.
Tal preocupação reflete-se no sistema imaginado para a implantação do processo educativo “caiomartiniano”: a criança é estabelecida num lar, vizinho de outros lares, da igreja, da farmácia, do campo-de-futebol, das oficinas artesanais e das áreas de produção agrícola, num conjunto emoldurado pela paisagem rural, física e humana, a sintetizar a comunidade, onde o fenômeno educativo se manifesta na espontaneidade e plenitude do contexto vital.
O pensamento de Dewey, que se conforma com o princípio de que “educação não é a preparação para a vida, mas educação é vida”, encontra, dentro das CAIO MARTINS, sua melhor concretização, pois ali se prepara o ambiente em que a criança logra existir plenamente, no conceito bio-psíquico, e desenvolver-se para a melhor vivência social num ambiente em que tudo seja educativo, até mesmo os fatores negativos, onde crianças e adultos auferem os benefícios de sua alta qualidade.
Longe ficou – repita-se a simples idéia de uma escola voltada tão somente para os cuidados com a boa cama e a boa mesa para o menino desajustado. Essa escola substituiu-se por outra muito mais rica de motivações se inspirações, estruturada à base de um complexo de fatores educativos muito mais espontâneo e eficiente na sua dinâmica e nos seus resultados.
Esta foi a idéia posta em prática pelas CAIO MARTINS, após o reconhecimento, por parte de seus dirigentes, da delicada filigrana que consubstancia o esforço objetivando a transformação do comportamento humano, em adequação com a problemática ambiente.
Organismo vivo, a entidade tendeu a desdobrar-se em novas estruturas, sempre atendendo à filosofia de repostamento às solicitações do meio com medidas adequadas. Surgiram, assim, depois da unidade instalada, em janeiro de 1948, na Fazenda Santa Tereza, município de Esmeraldas.
1 – ESCOLA DE PIRAPORA, a primeira do vale do São Francisco. Instalada em velho prédio, na então vila de Buritizeiros, esta unidade enfatizava, em seu currículo, aquelas atividades de maior afinidade com a região – a agropecuária, a pesca e a navegação.
2- NÚCLEOS COLONAIS DOS VALES DO CARINHANHA E URUCUIA, condicionados pela ocorrência de duas circunstâncias felizes: a existência de vastas áreas de terras inaproveitadas de boa qualidade e à presença de uma população rural inteiramente desassistida e em permanente migração.
3 – CENTROS DE TREINAMENTOS DE JOVENS LÍDERES RURAIS DE SÃO FRANCISCO E JANUÁRIA, onde se pôs em prática uma experiência nova, talvez a primeira do continente sul americano, assinalada pela preocupação de levar o princípio da escola ativa e da educação global dos mais distantes e atrasados rincões do Estado, através de líderes convenientemente preparados e devolvidos às áreas de origem.
4 – CURSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES, predominantemente para jovens do sexo masculino, com o qual se propunha desdobrar, até onde possível, o sistema integrado em Esmeraldas e outros núcleos, assim como lastrear a própria filosofia da obra. Vale evidenciar que este Curso, então identificado como Curso Normal Regional, ensaiou, por seus objetivos a sua atuação, uma experiência nova, hoje exaltada através dos chamados Colégios Polivalentes: dar ao educando, lado a lado com a preparação intelectual, um princípio de qualificação profissional. O professor formado nesta escola deveria ter, para preencher-lhe o tempo ocioso, depois das aulas, uma profissão que lhe permitisse, de um lado, complementar a receita e, de outro, o ensejo de ampliar seus serviços à comunidade e, destarte, alargar a influencia da própria liderança a que se destinara.
- ESTRUTURA –
Concebida sem maiores ambições, a entidade procurou plasmar-se com simplicidade, de modo a não envolver maiores responsabilidades para o Governo do Estado.
O decreto-lei publicado a 5 de janeiro de 1948 dava à organização um cunho experimental, liberando seus dirigentes de dedicação exclusiva. Os componentes do primeiro Conselho Diretor da entidade desempenharam, de fato, suas funções sem prejuízo de suas atividades normais na Polícia Militar e sem qualquer remuneração.
Há de se acrescentar ter sido esta época, não obstante, a fase das grandes realizações administrativas, com o enriquecimento do patrimônio institucional. Ao tempo, somente os diretores de cada um dos estabelecimentos de rede escolar serviam à obra em regime de tempo integral.
Neste período, assinaram-se convênios com a Campanha Nacional da Educação Rural – CNER, do Ministério da Educação, com o Ministério da Agricultura através do extinto Instituto Nacional de Imigração e Colonização, com o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos e com a Comissão do Vale do São Francisco.
A entidade, a essa altura já pluralizada, usufruía também dos benefícios de um salutar entrosamento com outros e diferentes órgão do Estado e da União. Com a Secretaria do Interior, entendia-se sobre o aspecto sócio-jurídico do menor e sobre questões de contratos de funcionários civis; a Secretaria de Educação respondia, como ainda hoje, pela condução do ensino nos níveis primários e secundários, a Secretaria da Agricultura comparecia, vez por outra, com a cessão de técnicos e a doação ou empréstimos de semovente; a Secretaria de Saúde mantinha na instituição - e o fez, durante anos – um médico, que não apenas assegurou a assistência especializada aos internos como preparou jovens enfermeiros lançados nos empreendimentos do vale do S. Francisco; a Companhia de Navegação do S. Francisco proporcionou, após o lançamento da escola de Buritizeiros ( então, município de Pirapora ) substancial ajuda na construção de uma pequena embarcação para a ligação entre os núcleos institucionais ribeirinhos, assim como no fornecimento do pessoal-de-bordo para a primeira lancha e apara o barco bandeirante “Raimundo Santos”, construído no Núcleo Colônia do Vale do Carinhanha. Do Ministério da Aeronáutica, por intermédio de D. Darcy Vargas, as Escolas receberam a pequena aeronave, ainda hoje em tráfego, batizada pelos meninos caiomartinianos de ANJO VERDE, porque lhes levava recursos financeiros, remédios, presentes e a própria mensagem da mística institucional.
Finalmente, a Polícia Militar proporcionou a composição do Conselho Diretor da entidade e forneceu as praças que foram os primeiros chefes de lares e artífices, assim como recursos materiais. Da colaboração de modestas praças dos destacamentos foi que chegaram à obra caiomartiniana recursos para as primeiras construções definitivas, após a instalação dos 18 primeiros internos no velho paiol da Fazenda Sta. Tereza. Há poucos anos, foram as Escolas anexadas à Polícia Militar, como Unidade, desaparecendo seu Conselho Diretor e com ele, alguns aspectos interessantes da obra.

- UMA VOCAÇÃO –
Por imperativos de uma viação, aguardam as Escolas uma definição e uma personalidade jurídica que melhor se ajustem à sua tradição, sua ordem e seus fins. As linhas atrás desenvolvidas revelam a natureza do empreendimento que, através dos tempos, vem se comportando como algo que tem, na própria dinâmica e na organicidade de sua estrutura, o estímulo que implementa e projeta as linhas do seu futuro. Servindo-se da miraculosa potencialidade que são os insondáveis da personalidade juvenil, a obra é, na sua essência, quase auto-suficiente. A assertiva encontra o testemunho no fato de terem as “Caio Martins” se desdobrando em sucessivos programas do mais arrojado pioneirismo, sem abertura de crédito financeiro pelo Governo e sem outros sacrifícios para o erário que não os da alimentação para menores tutelados pelo Poder Público. Considerados os recursos empenhados na construção dos diferentes núcleos caiomartinianos e o vulto das obras realizadas, ter-se-á uma visão da realidade. Pode-se assegurar – não fossem essas obras realizadas com os meios advindos do próprio potencial da instituição e teria sido alcançada, desde os primeiros tempos, a auto-suficiência tão sonhada pelas obras assistenciais.
Em abono desta tese, cumpre ainda assinalar as aquisições, pelas economias da entidade, das 4 salas em que funciona, em Belo Horizonte, a direção geral das Escolas e das 4 glebas que acresceram o patrimônio da Fazenda Sta. Tereza, assim como de outra também os rebanhos distribuídos pelas Escolas de Esmeraldas, Pirapora, São Francisco e Núcleos Coloniasi do Carinhanha e do Urucuia, também formados com recursos oriundos da própria instituição. Em 1952, as Caio Martins possuíam rebanho bovino superior a 500 ( quinhentas ) cabeças.
Levando-se em conta o exposto, evidencia-se apenas a potencialidade do obra, conduzida com acerto, no aproveitamento, valorização e orientação do trabalho do jovem educando.
Se considerarmos, porém, a possibilidade de cada unidade escolar já existente, subsidiada a entidade com um projeto sócio-econômico, de base técnica capaz de lhe suplantar o lastro patrimonial e a potencialidade já comprovada com as vantagens da ajuda externa, inclusive, quando for o caso, de órgãos de financiamento internacional, podemos imaginar quais seriam o futuro e a qualidade dos feitos da entidade caiomartiniana. No mesmo passo, a permanência do “status quo” atual, em que a obra, atingida por injunções da hora presente e circunstâncias a marcarem, no momento, a vida e o trabalho da Polícia Militar, tende a estagnar-se e mesmo a diluir-se, leva a conclusões bem pessimistas:
1º. – Coloca-se em perigo de descrédito e, talvez, de extinção uma experiência que, no seu alvorecer, despertou a atenção de famosos nomes vinculados à educação e à sociologia aplicada, tais como Pierre Bouvet, Helena Antipoff, Lourenço Filho, Cândido Jucá Fo. E o próprio diretor da Cidade dos Meninos, Pe. Flanagan. Citem-se as palavras de Lourenço Filho, quando as CAIO MARTINS eram o incipiente núcleo da Fazenda Sta. Tereza, de Esmeraldas:
“Quando, na UNESCO procurávamos uma solução para a educação de comunidades nos países subdesenvolvidos, em verdade, sonhávamos com aquilo que viríamos encontrar na escola CAIO MARTINS”.
2º -Subtraímos – o que é mais grave, considerando o interesse social em jogo, agora tomado em dimensão nacional – a oportunidade que tem o Estado e a União de verem desdobrar-se, em benefício das populações necessitadas de vastas áreas interioranas e de legiões de jovens desamparados, um empreendimento que poderia, em poucas décadas, cobrir imensos espaços vazios do nosso território, com um esforço da maior valia, no sentido de uma ocupação efetiva.
- DESTINO –
Ressalta do que foi dito que as CAIO MARTINS, envolvendo um complexo de atividades que respondem a uma imensa variedade de solicitações dos seres humanos e da sociedade, não poderiam ajustar-se a um único setor de atendimento. Não poderiam filiar-se à Secretaria do Interior, em que pese o relacionamento de sua missão com a do Estado através da proteção à criança; não poderiam inscrever-se no quadro da Secretaria da Agricultura por maiores que sejam as afinidades desta repartição do Governo com a obra, voltada quase integralmente, em sua filosofia e seu programa para organização rural; não poderiam jungir-se igualmente à Secretaria de Educação, cujo compromisso convencional com o problema educativo, atém-se obviamente à ortodoxia imposta pela necessidade de atingir com processos simples de formação curricular áreas de diversificado padrão cultural; não poderiam filiar-se à Secretaria do Trabalho, que envolve áreas extensas, mas específicas, nas responsabilidades de formação e ajustamento do homem ao labor, ela também contingente e necessitaria por sua vez da colaboração dos demais órgãos; finalmente, não se poderia imaginar as CAIO MARTINS acrescendo o volume de responsabilidade a pesar hoje sobre a Polícia Militar. Incumbindo-se esta do policiamento em mais de 700 cidades e milhares de vilas e povoados, bem como, do Serviço de Trânsito, da Polícia Florestal, do Serviço de Bombeiros e do esforço de formação básica dos filhos dos próprios componentes e da parcela do mundo civil, através dos Colégios “Tiradentes”, seria um desacerto impor-lhe carga insuportável, mormente se se considerar a variedade dos temas que constituem o acervo filosófico da obra: ruralismo, educação do menor desvalido, educação de comunidade, aprendizagem profissional, economia doméstica, atividades extracurriculares para ambos os sexos.
Deve-se, finalmente, ressaltar as características “sui-generis” das CAIO MARTINS, na paisagem humana abrangida por seus serviços.
A composição do quadro em que atuam não se restringe à faixa do menor desamparado da conceituação tradicional. Vai bem além. Atinge o filho do lavrador e, com este, a sua família, realiza trabalho de profilaxia do êxodo rural. E mais: apanhando o menor desamparado do grande centro, busca a entidade devolvê-lo às atividades que constituíram a tradição de sua família, tornando-o quase sempre um divulgador de idéias profissionais de seus antepassados, em estágio de promoção. Nisto, precisamente, está a diferença entre CAIO MARTINS e a FEBEM que age na área do menor desvalido, dando-lhe formação profissional ajustada tão somente à sua recuperação em bases racionais sem a preocupação, porém, da formação de lideranças, preocupação que foge à sua problemática, para a estruturação de comunidades rurais, consoante a da natureza da instituição caiomartiniana.
As CAIO MARTINS necessitam obviamente da colaboração de todos os órgãos citados, mas não podem, por sua própria natureza eclética, vincular-se especificamente a qualquer deles.
A estrutura de Fundação, universalmente consagrada, é por isto mesmo, o caminho, a vocação, o destino irreversível de uma obra surgida para trabalho identificado com os mais caros e legítimos anseios da pátria.

Um comentário:

  1. ZMauricio Vasconcelos3 de janeiro de 2012 às 03:57

    Paula, que beleza de trabalho! Muito bom a gente ver os detalhes da carreira do seu avô; que assim ficam ficam gravados para a posteridade! Parabens!

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