sábado, 24 de dezembro de 2011

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Blog de pesquisa sobre a obra de Manoel José de Almeida, militar, político e educador.

HISTÓRICO DAS ESCOLAS CAIO MARTINS - (SEM DATA)

História
Filosofia
Estrutura
Ação
Destino

- UMA IDEIA –
As escolas CAIO MARTINS nasceram de um ideal relacionado com a formação do homem a serviço da ordem. Propunham-se à prática de atividades capazes de modificar o comportamento convencional, isto é, a velha praxe da repressão e da vigilância dos atos anti-sociais. E, pretendiam assim realizar obra pioneira, diferente de tudo quanto, até então, se havia intentado, no delicado campo em que iriam atuar. Em síntese era a substituição paulatina do vigiar e reprimir pelo educar e assistir.
A meta seria atingida através da convivência dos servidores da Policia Militar com o fator embrionário dos delitos - a criança desamparada ou simplesmente necessitada de recursos capazes de lhe permitirem uma adequada formação da personalidade. A idéia teria sua fecundação no encontro do servidor da causa pública – o soldado – com aquele que seria, por diante, objeto de suas atenções e cuidados.
Eis quando se verifica o confronto de duas realidades objetivas geradoras de uma resposta, que haveria de conferir à obra um programa e uma filosofia.
- UMA FILOSOFIA –
Tão logo chamado à nobre missão assim proposta, verificou o miliciano, transformado em educador, que a tarefa não se resumiria no simples esforço de prover alimento e agasalho a quem não desfrutava desses bens materiais. Tratava-se de empresa complexa, a exigir, para a composição do programa global de resposta a necessidades, muito variadas, específicas, e reais, de um esforço bem maior e mais inteligente do que se poderia imaginar de início.
A criança no lar confere responsabilidade de uma programação plástica, de modo a construir com a imensa gama das solicitações da personalidade, o modelo da escola que a ciência pedagógica há anos persegue e só nos dias que correm emerge no painel das aspirações humanas.
- PROGRAMA DE AÇÃO –
A ação da entidade nascente deveria incidir nesta ordem de pensamento, já agora transformando em programa. Ultrapassado ficou o elementar cuidado visando sanar carências materiais apenas, quase sempre filhas de desajustamentos sócio-econômicos. Essa preocupação cedia lugar a outra de conteúdo dirigido ao atendimento da personalidade, portadora muitas vezes, em suas origens, de lastros negativos a serem pensados, estudados e corrigidos.
Tal preocupação reflete-se no sistema imaginado para a implantação do processo educativo “caiomartiniano”: a criança é estabelecida num lar, vizinho de outros lares, da igreja, da farmácia, do campo-de-futebol, das oficinas artesanais e das áreas de produção agrícola, num conjunto emoldurado pela paisagem rural, física e humana, a sintetizar a comunidade, onde o fenômeno educativo se manifesta na espontaneidade e plenitude do contexto vital.
O pensamento de Dewey, que se conforma com o princípio de que “educação não é a preparação para a vida, mas educação é vida”, encontra, dentro das CAIO MARTINS, sua melhor concretização, pois ali se prepara o ambiente em que a criança logra existir plenamente, no conceito bio-psíquico, e desenvolver-se para a melhor vivência social num ambiente em que tudo seja educativo, até mesmo os fatores negativos, onde crianças e adultos auferem os benefícios de sua alta qualidade.
Longe ficou – repita-se a simples idéia de uma escola voltada tão somente para os cuidados com a boa cama e a boa mesa para o menino desajustado. Essa escola substituiu-se por outra muito mais rica de motivações se inspirações, estruturada à base de um complexo de fatores educativos muito mais espontâneo e eficiente na sua dinâmica e nos seus resultados.
Esta foi a idéia posta em prática pelas CAIO MARTINS, após o reconhecimento, por parte de seus dirigentes, da delicada filigrana que consubstancia o esforço objetivando a transformação do comportamento humano, em adequação com a problemática ambiente.
Organismo vivo, a entidade tendeu a desdobrar-se em novas estruturas, sempre atendendo à filosofia de repostamento às solicitações do meio com medidas adequadas. Surgiram, assim, depois da unidade instalada, em janeiro de 1948, na Fazenda Santa Tereza, município de Esmeraldas.
1 – ESCOLA DE PIRAPORA, a primeira do vale do São Francisco. Instalada em velho prédio, na então vila de Buritizeiros, esta unidade enfatizava, em seu currículo, aquelas atividades de maior afinidade com a região – a agropecuária, a pesca e a navegação.
2- NÚCLEOS COLONAIS DOS VALES DO CARINHANHA E URUCUIA, condicionados pela ocorrência de duas circunstâncias felizes: a existência de vastas áreas de terras inaproveitadas de boa qualidade e à presença de uma população rural inteiramente desassistida e em permanente migração.
3 – CENTROS DE TREINAMENTOS DE JOVENS LÍDERES RURAIS DE SÃO FRANCISCO E JANUÁRIA, onde se pôs em prática uma experiência nova, talvez a primeira do continente sul americano, assinalada pela preocupação de levar o princípio da escola ativa e da educação global dos mais distantes e atrasados rincões do Estado, através de líderes convenientemente preparados e devolvidos às áreas de origem.
4 – CURSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES, predominantemente para jovens do sexo masculino, com o qual se propunha desdobrar, até onde possível, o sistema integrado em Esmeraldas e outros núcleos, assim como lastrear a própria filosofia da obra. Vale evidenciar que este Curso, então identificado como Curso Normal Regional, ensaiou, por seus objetivos a sua atuação, uma experiência nova, hoje exaltada através dos chamados Colégios Polivalentes: dar ao educando, lado a lado com a preparação intelectual, um princípio de qualificação profissional. O professor formado nesta escola deveria ter, para preencher-lhe o tempo ocioso, depois das aulas, uma profissão que lhe permitisse, de um lado, complementar a receita e, de outro, o ensejo de ampliar seus serviços à comunidade e, destarte, alargar a influencia da própria liderança a que se destinara.
- ESTRUTURA –
Concebida sem maiores ambições, a entidade procurou plasmar-se com simplicidade, de modo a não envolver maiores responsabilidades para o Governo do Estado.
O decreto-lei publicado a 5 de janeiro de 1948 dava à organização um cunho experimental, liberando seus dirigentes de dedicação exclusiva. Os componentes do primeiro Conselho Diretor da entidade desempenharam, de fato, suas funções sem prejuízo de suas atividades normais na Polícia Militar e sem qualquer remuneração.
Há de se acrescentar ter sido esta época, não obstante, a fase das grandes realizações administrativas, com o enriquecimento do patrimônio institucional. Ao tempo, somente os diretores de cada um dos estabelecimentos de rede escolar serviam à obra em regime de tempo integral.
Neste período, assinaram-se convênios com a Campanha Nacional da Educação Rural – CNER, do Ministério da Educação, com o Ministério da Agricultura através do extinto Instituto Nacional de Imigração e Colonização, com o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos e com a Comissão do Vale do São Francisco.
A entidade, a essa altura já pluralizada, usufruía também dos benefícios de um salutar entrosamento com outros e diferentes órgão do Estado e da União. Com a Secretaria do Interior, entendia-se sobre o aspecto sócio-jurídico do menor e sobre questões de contratos de funcionários civis; a Secretaria de Educação respondia, como ainda hoje, pela condução do ensino nos níveis primários e secundários, a Secretaria da Agricultura comparecia, vez por outra, com a cessão de técnicos e a doação ou empréstimos de semovente; a Secretaria de Saúde mantinha na instituição - e o fez, durante anos – um médico, que não apenas assegurou a assistência especializada aos internos como preparou jovens enfermeiros lançados nos empreendimentos do vale do S. Francisco; a Companhia de Navegação do S. Francisco proporcionou, após o lançamento da escola de Buritizeiros ( então, município de Pirapora ) substancial ajuda na construção de uma pequena embarcação para a ligação entre os núcleos institucionais ribeirinhos, assim como no fornecimento do pessoal-de-bordo para a primeira lancha e apara o barco bandeirante “Raimundo Santos”, construído no Núcleo Colônia do Vale do Carinhanha. Do Ministério da Aeronáutica, por intermédio de D. Darcy Vargas, as Escolas receberam a pequena aeronave, ainda hoje em tráfego, batizada pelos meninos caiomartinianos de ANJO VERDE, porque lhes levava recursos financeiros, remédios, presentes e a própria mensagem da mística institucional.
Finalmente, a Polícia Militar proporcionou a composição do Conselho Diretor da entidade e forneceu as praças que foram os primeiros chefes de lares e artífices, assim como recursos materiais. Da colaboração de modestas praças dos destacamentos foi que chegaram à obra caiomartiniana recursos para as primeiras construções definitivas, após a instalação dos 18 primeiros internos no velho paiol da Fazenda Sta. Tereza. Há poucos anos, foram as Escolas anexadas à Polícia Militar, como Unidade, desaparecendo seu Conselho Diretor e com ele, alguns aspectos interessantes da obra.

- UMA VOCAÇÃO –
Por imperativos de uma viação, aguardam as Escolas uma definição e uma personalidade jurídica que melhor se ajustem à sua tradição, sua ordem e seus fins. As linhas atrás desenvolvidas revelam a natureza do empreendimento que, através dos tempos, vem se comportando como algo que tem, na própria dinâmica e na organicidade de sua estrutura, o estímulo que implementa e projeta as linhas do seu futuro. Servindo-se da miraculosa potencialidade que são os insondáveis da personalidade juvenil, a obra é, na sua essência, quase auto-suficiente. A assertiva encontra o testemunho no fato de terem as “Caio Martins” se desdobrando em sucessivos programas do mais arrojado pioneirismo, sem abertura de crédito financeiro pelo Governo e sem outros sacrifícios para o erário que não os da alimentação para menores tutelados pelo Poder Público. Considerados os recursos empenhados na construção dos diferentes núcleos caiomartinianos e o vulto das obras realizadas, ter-se-á uma visão da realidade. Pode-se assegurar – não fossem essas obras realizadas com os meios advindos do próprio potencial da instituição e teria sido alcançada, desde os primeiros tempos, a auto-suficiência tão sonhada pelas obras assistenciais.
Em abono desta tese, cumpre ainda assinalar as aquisições, pelas economias da entidade, das 4 salas em que funciona, em Belo Horizonte, a direção geral das Escolas e das 4 glebas que acresceram o patrimônio da Fazenda Sta. Tereza, assim como de outra também os rebanhos distribuídos pelas Escolas de Esmeraldas, Pirapora, São Francisco e Núcleos Coloniasi do Carinhanha e do Urucuia, também formados com recursos oriundos da própria instituição. Em 1952, as Caio Martins possuíam rebanho bovino superior a 500 ( quinhentas ) cabeças.
Levando-se em conta o exposto, evidencia-se apenas a potencialidade do obra, conduzida com acerto, no aproveitamento, valorização e orientação do trabalho do jovem educando.
Se considerarmos, porém, a possibilidade de cada unidade escolar já existente, subsidiada a entidade com um projeto sócio-econômico, de base técnica capaz de lhe suplantar o lastro patrimonial e a potencialidade já comprovada com as vantagens da ajuda externa, inclusive, quando for o caso, de órgãos de financiamento internacional, podemos imaginar quais seriam o futuro e a qualidade dos feitos da entidade caiomartiniana. No mesmo passo, a permanência do “status quo” atual, em que a obra, atingida por injunções da hora presente e circunstâncias a marcarem, no momento, a vida e o trabalho da Polícia Militar, tende a estagnar-se e mesmo a diluir-se, leva a conclusões bem pessimistas:
1º. – Coloca-se em perigo de descrédito e, talvez, de extinção uma experiência que, no seu alvorecer, despertou a atenção de famosos nomes vinculados à educação e à sociologia aplicada, tais como Pierre Bouvet, Helena Antipoff, Lourenço Filho, Cândido Jucá Fo. E o próprio diretor da Cidade dos Meninos, Pe. Flanagan. Citem-se as palavras de Lourenço Filho, quando as CAIO MARTINS eram o incipiente núcleo da Fazenda Sta. Tereza, de Esmeraldas:
“Quando, na UNESCO procurávamos uma solução para a educação de comunidades nos países subdesenvolvidos, em verdade, sonhávamos com aquilo que viríamos encontrar na escola CAIO MARTINS”.
2º -Subtraímos – o que é mais grave, considerando o interesse social em jogo, agora tomado em dimensão nacional – a oportunidade que tem o Estado e a União de verem desdobrar-se, em benefício das populações necessitadas de vastas áreas interioranas e de legiões de jovens desamparados, um empreendimento que poderia, em poucas décadas, cobrir imensos espaços vazios do nosso território, com um esforço da maior valia, no sentido de uma ocupação efetiva.
- DESTINO –
Ressalta do que foi dito que as CAIO MARTINS, envolvendo um complexo de atividades que respondem a uma imensa variedade de solicitações dos seres humanos e da sociedade, não poderiam ajustar-se a um único setor de atendimento. Não poderiam filiar-se à Secretaria do Interior, em que pese o relacionamento de sua missão com a do Estado através da proteção à criança; não poderiam inscrever-se no quadro da Secretaria da Agricultura por maiores que sejam as afinidades desta repartição do Governo com a obra, voltada quase integralmente, em sua filosofia e seu programa para organização rural; não poderiam jungir-se igualmente à Secretaria de Educação, cujo compromisso convencional com o problema educativo, atém-se obviamente à ortodoxia imposta pela necessidade de atingir com processos simples de formação curricular áreas de diversificado padrão cultural; não poderiam filiar-se à Secretaria do Trabalho, que envolve áreas extensas, mas específicas, nas responsabilidades de formação e ajustamento do homem ao labor, ela também contingente e necessitaria por sua vez da colaboração dos demais órgãos; finalmente, não se poderia imaginar as CAIO MARTINS acrescendo o volume de responsabilidade a pesar hoje sobre a Polícia Militar. Incumbindo-se esta do policiamento em mais de 700 cidades e milhares de vilas e povoados, bem como, do Serviço de Trânsito, da Polícia Florestal, do Serviço de Bombeiros e do esforço de formação básica dos filhos dos próprios componentes e da parcela do mundo civil, através dos Colégios “Tiradentes”, seria um desacerto impor-lhe carga insuportável, mormente se se considerar a variedade dos temas que constituem o acervo filosófico da obra: ruralismo, educação do menor desvalido, educação de comunidade, aprendizagem profissional, economia doméstica, atividades extracurriculares para ambos os sexos.
Deve-se, finalmente, ressaltar as características “sui-generis” das CAIO MARTINS, na paisagem humana abrangida por seus serviços.
A composição do quadro em que atuam não se restringe à faixa do menor desamparado da conceituação tradicional. Vai bem além. Atinge o filho do lavrador e, com este, a sua família, realiza trabalho de profilaxia do êxodo rural. E mais: apanhando o menor desamparado do grande centro, busca a entidade devolvê-lo às atividades que constituíram a tradição de sua família, tornando-o quase sempre um divulgador de idéias profissionais de seus antepassados, em estágio de promoção. Nisto, precisamente, está a diferença entre CAIO MARTINS e a FEBEM que age na área do menor desvalido, dando-lhe formação profissional ajustada tão somente à sua recuperação em bases racionais sem a preocupação, porém, da formação de lideranças, preocupação que foge à sua problemática, para a estruturação de comunidades rurais, consoante a da natureza da instituição caiomartiniana.
As CAIO MARTINS necessitam obviamente da colaboração de todos os órgãos citados, mas não podem, por sua própria natureza eclética, vincular-se especificamente a qualquer deles.
A estrutura de Fundação, universalmente consagrada, é por isto mesmo, o caminho, a vocação, o destino irreversível de uma obra surgida para trabalho identificado com os mais caros e legítimos anseios da pátria.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

1978 - O CAFÉ E A ECONOMIA NACIONAL

CÂMARA DOS DEPUTADOS
MANOEL DE ALMEIDA
DEPUTADO FEDERAL

O CAFÉ E A ECONOMIA NACIONAL
BRASÍLIA – 1978

Sr. Presidente, Srs. Deputados a história da economia nacional se escreve com a agricultura – raiz e seiva – a implementar o sistema de sustentação que possibilitou o alvorecer da indústria, no final do século dezenove. Contar essa história é repetir o que é elementar os compêndios da história econômica e social do País, constituindo-se em matéria ao alcance de todos.
Não é de mais lembrar, no entanto, que a indústria e o comércio são como que frutos da agricultura, e nela se embasam e, ainda hoje, se nutrem. Não é excessivo repetir, por outro lado, que a mais antiga das atividades econômicas está sempre a vivificar a lenda do pelicano, que alimenta a prole com o próprio organismo.
É evidente que tal sacrifício não episódico, mas contínuo e persistente, poderá nas próximas décadas concluir por afetar profundamente esse organismo, a ponto de levá-lo ao extermínio. Esta é, seguramente, a situação em que se encontra a agricultura brasileira.
O Brasil vive, sem dúvida, momento de contagiante pessimismo, diante do quadro de gravidade em que se encontram as atividades primárias. Não podemos esconder a dura realidade de que todos participamos, políticos ou agricultores, os brasileiros em geral, sofrendo direta ou indiretamente as conseqüências do fenômeno.
Assinale-se, entre os fatores a concorrer para esse quadro: o aumento considerável dos custos pertinentes aos tratos culturais, notadamente a mão-de-obra e, muito especialmente, os insumos básicos, entre estes os fertilizantes que vem, após freqüentes majorações de preços, situando-se amplamente acima da viabilidade financeira da atividade agrícola. E, mais ainda, a circunstância de que esses fertilizantes, subsidiados em 40% pelo Governo, deixaram de o ser, em momento de crise, para o café.
Agravando esse clima, tem-me a estagnação comercial do principal produto agrícola, com reflexos em todos os setores considerada sua importância na composição da pauta de exportações, no volume de emprego gerado pela atividade cafeeira, além das implicações diretas e indiretas na estrutura industrial e de serviços derivados da cafeicultura.
Não é destituído de sentido afirmar tratar-se o café, por excelência, de uma das culturas agrícolas de mais acentuado “caráter social”, à medida que se reconhece apresentar coeficientes de absorção de mão de obra ( seja por hectare ou por estabelecimento ) os mais expressivos.
O testemunho disso nós temos de forma contundente em nosso sentimento de solidariedade, quando vemos o êxodo desordenado do Paraná para os Estados de São Paulo e Minas Gerais , de milhares de famílias de desempregados pelo colapso da cafeicultura no Estado irmão, face à agressão da geada ou da estiagem constatada de maneira mais recente.
Assistimos de perto, no sul de Minas, aos reflexos da imprevidência dos altos bastidores, a quem caberia a normativa para as medidas profiláticas, por ocasião da chegada dessas pobres famílias, arrancadas violentamente de suas moradias, pela fome, pela ausência de trabalho remunerado ou de assistência de qualquer natureza.
O plantio da soja e outras atividades culturais que conjunturalmente tem compensado o motivo do café, do ponto de vista de oferta de empregos, não possuem uma estatura capaz de realocar toda aquela população. Esse contingente adicional aportou à região, inicialmente, em boa hora, coincidindo com a safra extraordinariamente farta do ano passado, inclusive no momento em que a mão de obra escassa no sul de Minas era, seguramente, o mais sério problema.
Todavia, tudo isso foi apenas um episódio. Enquanto uma região se beneficiava comas “vacas gordas”, a outra sofria os efeitos das “vacas magras”.
Como resultado de fatores climáticos adversos ou fundado a imprevidência, tem o café sempre apresentado distorções de quantum produzido e de preços que como salto final, tem resultado na elevação constante dos preços para consumidor afastando-se, dia a dia, o produto da mesa do brasileiro médio, e sem que estes preços venham efetivamente a remunerar o esforço do produtor.
Tudo isso nos leva a preconizar que o zoneamento em regiões ecologicamente apropriadas – catilinária lida por todos os entendidos e que já produziu cansaço em nossos ouvidos – é a medida imperiosa, é o procedimento racional, é o dever de ação conjunta do Ministério da Agricultura e do Instituto Brasileiro do Café. A matéria deve ser encarada em termos de Brasil e não de prejudiciais ufanismos regionalistas, que resultam sempre em graves conseqüências para as nossas escassas disponibilidades de financiamento ou na necessidade de contornar expost os “acidentes” ( ou não seriam determinismos? )atribuídos à ecologia adversa.
Vivemos o limiar do terceiro milênio, quando grande parte dos fenômenos podem ser previstos e controlados.
Ontem era o êxodo do Nordeste, causado pela natureza do clima desigual e restritivo. Para minimizar os efeitos do fenômeno criou-se a SUDENE que vem, com seus esforços fornecendo alguns saldos positivos. Hoje são as geadas do Paraná ou a estiagem no Sul, responsáveis por prejuízos de toda sorte, e, especialmente, pelo sofrimento de seres humanos, sofrimento este que precisa ser aquilatado de maneira mais próxima, para que se entenda como são irresponsáveis, as vezes, certas orientações administrativas, pelos males que determinam para vastos segmentos de nossa população. Onde se encontram as ciências, a logística, a capacidade de prever e planejar dos nossos técnicos?
Solução meridiana e de simples decisão conduzida pelo bom senso vem a ser a divisão do País em zonas ecológicas pré-definidas segundo o potencial real, segundo a efetiva margem de segurança para cultivos adaptados, ou a existência de vantagens comparativas, evidentes, relacionadas à produção regional ou zonal programada. Teríamos uma agricultura ditada pela razão, bem estruturada e protegida em larga margem das intempéries e outros fatores negativos, entre estes os gastos não recuperáveis em imobilizações de recursos financeiros, nas medidas de prorrogações de prazos, manutenção de preços e outras da mesma ordem, que significam sempre prejuízos à Nação.
Urge, pois, corajosa decisão dos órgãos responsáveis do Governo!
Paralelamente, precisamos adotar uma política mais realista, uniforme e efetiva de preços mínimos dos produtos agrícolas garantidos pelo Governo. Esta política, convenhamos, já existe. Todavia, ninguém, em plena consciência, pode nela confiar. Que sirva de exemplo o recente episódio do milho e, mais recente ainda, o da cebola. Ambos os casos dispensam maior análise e adjetivação, conhecidos que são, em seus efeitos, em todas as camadas sociais.
Sem pretender nos transformarmos em árbitros dessa política econômica setorial, parece-nos óbvio que os agentes do Governo, com atuação nessa área, deviam, mercê da longa vivência, haurida na repetição dos fatos, adotar uma conduta e um critério que seriam o inverso do slogan amplamente divulgado nas propagandas à custa do erário: “plante que o governo garante” – por outra norma, esta orientada na própria experiência do agricultor e resposta à primeira: “ garanta, que nós plantamos.”
No café, entretanto, se configura o maior drama. Voltando os olhos ao passado, veremos que já mais de cento e cinqüenta anos, nas Minas Gerais, a rubiácea negra começava a ocupar o lugar das lavras auríferas exauridas e, daí, para cá, lá e em outros Estados, tem sido o café responsável por toda a combustão que tem gerado energia para a construção da economia do País. No alvorecer deste século, o fato mais se acentua, e a partir a década de vinte, a incipiente indústria nacional passa a ganhar certo relevo, quase que exclusivamente estipendiada pelo café. A nossa história econômica, repitamos, é a história do café a transferir rendas para as demais atividades, sem participar, ao final dos resultados líquidos de geração de renda que aquela atividade tornou possível.
Não negamos, sensíveis progressos técnicos foram assinalados, ultimamente, nos novos plantios. Entretanto, ainda andamos a reboque das conquistas das ciências, sendo apenas marginalmente implementadas novas técnicas que contribuem para aumentar a produtividade dos cultivos.
Não obstante, em menor escala, esse retorno (feed-back) das outras atividades produtivas e do próprio conhecimento técnico nem de perto se compara com a intensidade de drenagem que se observa no sentido assinalado: da agricultura para as demais atividades.
E as eventuais vantagens de interação inter-setorial se anulam face à comercialização do produto, a fase de operação que mais de perto interessa à Nação. Poucos sabem que continuamos vendedores residuais, ou seja, vendemos o nosso café depois que outros países concorrentes já liberaram os seus estoques disponíveis.
Se considerarmos que e época não muito distantes – quando o quadro estatístico nos era favorável quanto ao consumo mundial - possuindo o IBC estoque bastante elevado e contando-se com a presença de homens ajustados ao encargo, determinou-se o desafogo dos nossos depósitos.
A referência traz-nos à memória a figura exemplar de Renato Costa Lima, excelente homem de empresa, conhecedor emérito da cafeicultura no País e que jamais desprezou ou subestimou aquele que cultiva ou negocia com o produto.
Vejamos o contraste: atualmente com um quadro estatístico favorável, dada a escassez do produto no plano mundial, não possuindo o IBC praticamente estoque assinalável, não conseguimos vender o café da safra passada, já diante da nova safra, com deprimentes conseqüências sócio-econômicas esperadas nas regiões produtoras.
Há crise pela paralisação nas fontes do produto e pela falta de recursos para os tratos culturais, mesmo entre os mais bem dotados de meios financeiros, os bons administradores ou os de economia estável.
E o que mais entristece é vermos que o nosso consumo interno manifesta, também, sintoma de declínio, fato, aliás, óbvio, mesmo quando compararmos as necessidades internas de ontem e as de hoje, levando em conta o fator de crescimento demográfico. É que o crescimento da população é mais intenso que o do número de pessoas que anualmente ingressa no mercado com poder aquisitivo real mínimo para exercer o consumo do produto, dentro do nosso modelo concentrador de rendas. Os preços internos do café tornaram seu consumo proibitivo para amplas faixas da população. Por outro lado, cinqüenta e dois por cento de nossa população é jovem: não seria o caso de subsidiar o café, para a merenda escolar e para as classes menos favorecidas, pelo menos?
Ocorre, porém, o contrário do subsídio. Temos o confisco, termo de acepção estranha, pois significa punição. É assim o café, além dos obstáculos antepostos ao longo do seu ciclo, do plantio à venda, um produto punido, um gênero que sofre as penas da lei, sem que tenha ferido o erário. Pelo contrário, sendo a agricultura o nosso principal artigo de mercado, é ainda hoje responsável por parcela considerável de nossa capacidade de atração de divisas. Os produtos industriais, ao contrário desse tratamento, recebem toda sorte de incentivos para a sua expansão.
Ouço o nobre Deputado José Mandelli
O Sr. José Mandelli – Nobre Deputado Manoel de Almeida, ilustre representante da bancada de Minas Gerais, estamos ouvindo seu substancioso discurso, em que focaliza os problemas agrícolas deste País, notadamente o café. Infelizmente – não é de agora – a política cafeeira tem sofrido sérias distorções, desde a escolha das áreas para o seu cultivo, como no caso do Paraná. As culturas, à medida que se espraiavam para o Sul, como um castigo e foram sendo dizimadas pelas geadas cíclicas. Nos anos de 1965/1966, nos armazéns do Instituto Brasileiro do Café, estavam estocadas cerca de 69 milhões de sacas. A política d então Ministro Roberto Campos era o sentido de estimular a erradicação do café. O Estado de V. Exa. sofreu enormemente com essa medida agressiva,em que o IBC pagava quatro cruzeiros por pé de café erradicado. Na ocasião, como membro de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, tive a oportunidade de percorrer todo o nosso território, investigando a ação do IBRA e do INDA em várias regiões. Na Serra do Baturité, assistimos a erradicação de café fino, cuja qualidade, em nada ficava a dever ao café colombiano. Cumpre observar que a fazenda em questão dispunha de formidável infra-estrutura, pátios imensos, descaroçadores etc. E, infelizmente, o café foi erradicado e malbaratado. Poderia ser plantado no Ceará, para o consumo daquela região. Hoje as autoridades governamentais estimulam vigorosamente o plantio do café. Mas não sei se estão considerando a ecologia, se a terra em que ele será cultivado, é apropriada para essa cultura, que é permanente – leva dois, três anos para produzir os primeiros frutos e mais de 100 anos para desgastar-se. Temos de zelar por essa nossa riqueza, que tanto contribuiu para o desbravamento do Estado de São Paulo, possibilitando-lhe elevado estágio de industrialização, atingida por intermédio do colono, do cafeicultor, que desbravou os nossos sertões. Felicito V. Exa. pelo importante tema que nos traz nessa triste tarde, quando poucos parlamentares se acham presentes no plenário.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Agradeço a V. Exa. o brilhante e oportuno aparte, que revela o homem do Sul, sempre sensível às coisas do País, Deputado pelo Brasil que é. Constatamos realmente essa contradição e essa desorganização: ontem erradicava-se o café para ganhar dinheiro; hoje, planta-se, também para ganhar dinheiro, mas sem a preocupação do zoneamento ecológico a que se refere V. Exa., o que salvaria nossa economia. O Governo gasta excessivamente neste setor, prorrogando as contas, deixando muita coisa a fundo perdido, para poder salvar essa economia nobre, que contribui ainda com mais de 30% para as nossas divisas.
Prossigo, Sr. Presidente.
Seria muito interessante que o Presidente Geisel chamasse a si, às vezes , a tarefa de conhecer pessoalmente certos problemas nacionais, não deixando esse encargo, como no caso do café, exclusivamente ao respectivos titular do instituo que se faz blaguer ao ouvir as aspirações dos cafeicultores de São Paulo e do Sul de Minas, quando manifestam intenção de trocar idéias com o Chefe da Nação sobre a problemática respectiva. Seria, acredito, de grande proveito um encontro dessa natureza.
Entre outras coisas, S. Exa. ficaria sabendo, em verdade singela, que a maior reivindicação do produtor não é por certo o credito per se, mas o preço justo e certo, divulgado com a necessária antecedência, a fim de que se haja tempo e condições de, baseado nos valores disponíveis, estruturar a distribuição de tarefas, realizar o fluxograma de produção. O agricultor quer, às vezes, o crédito, mas acalenta muito mais a esperança de obter compreensão em sua luta, em sua vida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, lembremos, para terminar, que não foi irrelevante o aumento ocorrido no Imposto de Renda do agricultor. Foi triplicado: de 5% passou a 15%; mesmo com a correção, para menos, imposta pelo Governo, a taxa é ainda de 15%.
Nesta ordem de pensamentos, vale lembrar Benjamin Franklin quando sentenciou: “Se as cidades forem destruídas e os campos preservados, as cidades ressurgirão, mas, se os campos forem abandonados, as cidades sucumbirão”.
Tenho dito, Sr. Presidente. (Palmas)

1978 - JOÃO RAFAEL

CÂMARA DOS DEPUTADOS
CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO

JOÃO RAFAEL : O NAVEGANTE DO SÃO FRANCISCO

COORDENAÇÃO DE PUBLICAÇÕES
BRASÍLIA – 1978

O SR MANOEL DE ALMEIDA (ARENA –MG) - Pronuncia o seguinte discurso
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o herói surge, sem programas prévios, sem profetas. É resultante de forças telúricas e tem sua base humana assentada nos arquétipos da raça. Alguns galgam as páginas da História; outros, com João Rafael, são anônimos e desaparecem como “o soldado desconhecido” de todas as guerras João Rafael, magnífico exemplar de sertanejo! Merece ser lembrado, como ponto alto dos valores que marcaram a velha navegação do São Francisco. Natural de Santana de Sobradinho, antes um celeiro de fluviários, e hoje, um marco do desenvolvimento nacional. Cedo a dirigir os pequeninos barcos a vela, o esforço de buscar o pão – que era o abençoado peixe, mais precisamente o acari – cascudo – das locas da cachoeira. Aí aprendeu a mergulhar perigosamente. E, no dizer de jovem poeta da região, “o andar pelas águas lhe deu braços fortes”, senso de oportunidade, coragem e decisão para os momentos difíceis. Foi o remeiro de barca, humilde função e pesado encargo, situado no inicio da aprendizagem; promoveu-se a marinheiro, onde se revelou destro e inteligente, tornando-se, pela prática, piloto de nossas gaiolas, de inesquecíveis lembranças. Passou a dirigir, com rara mestria, os navios são–franciscanos. Como poucos, enfrentou as duras peripécias da profissão. Ainda se ouve dizer, por onde ele andou: João Rafael, no leme, era confiança para todos. Navio que ele dirigia não ia de encontro a bancos de areia, a paus ou pedras. Era famoso e chegava a ser belo, no seu biótipo de homem esbelto e forte. Preto, bem preto, era um espécimen a consagrar a etnia africana que tanto contribuiu no stock racial da Terra de Santa Cruz. Sua primeira atividade na “marinhagem fluvial” foi na navegação baiana, vindo depois para a mineira, nos tempo do Governo de Wenceslau Braz, que amou as coisas do Rio da Unidade Nacional e impulsionou a sua navegação. Daí a homenagem que lhe prestaram. É o “Wenceslau” o navio mais preso à alma barranqueira, com aquele “apito” choroso e sentimental que despertou em seguidas gerações o sono da gente sertaneja. Durante muitos anos a serviço do transporte regional, apinhado de passageiros e carga, é ele, hoje, pálida lembrança: serve apenas ao turismo, ao lazer, à curiosidade cultural.
Voltemos, porém, a João Rafael, o nosso herói. Um dia ele teve destino adverso: encontrou a tempestade no Mocambo dos Ventos, lugar perigoso e fatídico, célebre pela ocorrência de naufrágios de embarcações de pequeno porte. O vapor Santa Clara, de construção estreita e equilíbrio precário, desempenhava magnífica performance, em sua segunda viagem, nas mãos firmes de João Rafael, quando foi colhido pelo temporal e tombou nas águas revoltas, desaparecendo, e com ele nove pessoas, tripulantes e passageiros. Entre os primeiros, a filha do Comandante Carlos Carneiro de Mendonça, a pequenina Ruth, de nove anos. O pai, enlouquecido, grita: “Salvem minha filha!” Ao pânico, acresce a dor. E os homens mais fortes e destemidos o cercam. Primeiro foi Cazumbá, que desapareceu nas águas na tentativa de algo fazer. Voltou desanimado, dizendo: “Localizei o camarote, mas é muito difícil”. João Rafael, presa de emoção diz: “Vou buscá-la”. Assiste-se, então, ao tempo que não se conta nos relógios. Diziam intranqüilos: “Está demorando, ele deve ter morrido também; não há possibilidade de êxito nessa terrível missão.” Corações opressos, respirações suspensas, todos vêem surgir, em dado momento, da água barrenta a cabeça de João e, em seguida, em seus braços o corpinho de Ruth! Mas, oh, destino! Já sem vida.
Lembro-me do fato, pois ocorreu em minha juventude. Viajei no Santa Clara, de São Francisco a Januária, e conheci Ruth, linda criança, viva e inteligente. No dia seguinte, quando o telégrafo informava o infortúnio, eu também vivi a emoção do fato. Destaque-se, neste relato, que àquela época – 1932 – não existia máscara de proteção para mergulho. A operação realizada por João Rafael, que envolve o esforço de romper a porta do camarote onde se encontrava a criança, se deveu à sua capacidade pulmonar e foi produto de um único mergulho.
Cultuemos, ainda em vida, a grandeza daquele bravo fluviário, legítima estrutura de herói humano.

1979 - ROTEIRO PARLAMENTAR

CÂMARA DOS DEPUTADOS
CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO

ROTEIRO PARLAMENTAR
DISCURSO PRONUNCIADO PELO DEPUTADO MANOEL DE ALMEIDA, NA SESSÃO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS DE 4-12-78

COORDENAÇÃO DE PUBLICAÇÕES – BRASÍLIA, 1979

Sr. Presidente, Srs. Deputados, reviver a minha vida pública, no setor da representação popular, constitui tarefa que se identifica com os ideais da mocidade, a partir do momento em que, membro de um corporação policial-militar, passei a ver na criança um fundamento essencial na vida das nações. Alguém disse que “a criança é o pai do homem”, e eu adotei o dístico como refrão e norma.
Situado num meio que tinha como tarefa rotineira a formação de caracteres para o esforço a serviço da Justiça cedo entendi que muito mais econômico e lógico seria cuidar da criança do que travar a luta tardia com o criminoso.
Protágoras, em recuados tempos, falou do homem como medida de todas as coisas, e eu entendi que, numa sociedade homogênea, melhor seria fazer do homem a medida exata para a sua missão na Terra. Assim surgiram as Escolas Caio Martins, hoje, Fundação Educacional Caio Martins, instituída pelo Governo mineiro.
A política viria apanhar-me quando, já afastado da função anterior, encontrava-me empolgado no esforço da profilaxia social envolvendo o homem e sua família, e, quando desgarrado pelo desajustamento, o menor desvalido.
Na Assembléia Legislativa de Minas Gerais, tive o meu primeiro encontro com os problemas do sertanejo. O São Francisco descamba da serra da Canastra, percorre parte do Sul mineiro e atravessa o centro-oeste do Estado, indo após Pirapora constituir o curso médio onde condensa, em suas margens, razoável população desde meados do século passado. Região de grandes planícies, sempre favoreceu o derramamento das águas para todos os lados no curso principal e nos afluentes na fase chuvosa. De tempo em tempo, os desregramentos eram maiores, cíclicos, como dizem os técnicos, determinando perda das lavouras, das casas e trazendo a época endêmica do paludismo devastador.
Na minha infância eu fui um flagelado, na cidade de Januária. Vi com meus olhos de criança o sofrimento da população urbana e senti na ausência de mantimentos a repercussão do fenômeno nas áreas rurais.
Quando entro no Governo o grande Presidente Juscelino Kubitschek, ninguém com mais autoridade do que eu para levar à presença de S. Exa. os prefeitos dos Municípios ribeirinhos à procura de solução para o caso.
Surge Três Marias, incluída como uma das metas do notável Presidente Surgem também contratempos. Os grupos econômicos das multinacionais que comandavam, à época, a exploração de energia elétrica no País preferiam a prioridade na construção de Furnas, eis que essa usina atenderia mais de perto aos objetivos privados. Trava-se uma luta, e nós, levantando perante a Nação o primado das necessidades do homem que precisava de saúde, transporte, agricultura segura e finalmente, também energia, formamos a base de opinião de que carecia o Presidente – e Três Marias tornou-se uma realidade.
O problema do homem, porém, permanecia em meu espírito, e a criança mineira desvalida se beneficia com o primeiro projeto, transformado em lei, criando o Serviço Social do Menor. A essa época, é claro, tudo o que fazíamos era segundo a tônica do trabalho anterior, nesse setor – as Escolas Caio Martins, fundadas em 1948.
A nossa passagem para o Congresso Nacional se deu no mandato subseqüente, e já no inicio da 1ª. Sessão Legislativa recebemos a incumbência muito honrosa de tomar parte na Comissão que redigiu o Projeto de Lei de Diretrizes e Bases do Ensino Nacional, onde figuravam entre outros, Santiago Dantas, Carlos Lacerda e Lauro Cruz, e aí recebi o banho lustral da experiência da cultura de grandes mestres.
Brasília surge no horizonte da Pátria no momento preciso em que borbulhavam em nossos sentimentos as emocionantes idéias de um país renovado e sacudido em seus valores. Poucos acreditavam nela. Da tribuna da Casa de Tiradentes no Rio de Janeiro, eu pronunciei o discurso que intitulei “O encontro do Buriti Perdido”, alusão à página de Afonso Arinos, quando em romagens pelos sertões que envolviam a capital-menina. Aí está Brasília, concreta, inteligente, urb et civitas, o maior interesse para quem visita o ocidente, brotada do engenho de Niemeyer, Lúcio Costa e do ideal do Presidente da linda epopéia. Encorajei, ainda daquela tribuna, a quantos se dispunham a vir aqui acompanhar com sua família dizendo a todos que aqui havia escolas de todos os níveis, inclusive universidade, a partir do segundo ano da nova Capital. E dei o exemplo com meu grupo familiar, trazendo a contribuição de uma professora (minha esposa) e um grupo discente, distribuído do pré-escolar ao pré-universitário. Dei a minha cota de fé a Brasília.
Aqui situado, respirando os are puros “deste Planalto Central, desta solidão...” que em breve se tornou sede dos destinos do Brasil novo, do Brasil emergente como potência de primeira grandeza, não podia eu desconhecer as razões da implantação aqui da sede do Governo. Penetrei na direção de todos os pontos cardeais e colaterais, vi o homem e sua família e senti sua grandeza mesmo na solidão, como pára-quedista, aqui lançados em tempos imemoriais e esquecidos pelos responsáveis dessa façanha, como se devessem involuir até o estágio bárbaro, adquirindo, por si mesmos, a estranha infra-estrutura de estranha organização social, capaz de lhes assegurar sustentação longe dos meios civilizados. E recomecei a pensar em termos do binômio homem do campo-criança.
Lembrando-me de pronunciamento feito ainda na Câmara velha, faço novo discurso e apresento novo projeto – Fundação Nacional de Educação de Base – em que , numa concepção global do problema, submeto à apreciação do Governo idéias que sintetizavam o plano de uma abordagem maior o problema da criança e do rurícola, em que eram principais objetos de enfoque, a costa marítima com o caiçara e sua família e o interior do País, onde o caboclo postula uma sobrevivência melhor através dos tempos desde que ali foi assentado.
Ao correr da construção de Furnas, apresento o projeto criado condomínio do Piuí, em terras recuperadas pelo DNOS, para recolocação de deslocados da bacia de acumulação da referida usina, projeto esse transformado em lei no Governo Goulart, e ainda outro projeto criando a Coordenação de Valorização dos rios Grande e Sapucaí, que não teve encaminhamento pela modificação constitucional decorrente da revolução de 1964.
Assim continuaram nossos trabalhos na rotina de uma vida parlamentar sempre baseada naqueles pressupostos que motivaram a minha vinda a esta Casa.
O Sr. Geraldo Guedes – Permite-me um aparte?
O SR. MANOEL DE ALMEIDA – Com muito prazer e honra, nobre Deputado.
O Sr. Geraldo Guedes – Sinto-me numa situação especial em aparteá-lo, porque me considero na dupla condição de seu colega e vizinho: colega desde os tempos do Tiradentes, onde começamos há 20 anos atrás, e vizinho pela circunstância muito afetuosa de haver privado da companhia de sua família e, conseqüentemente, não poder deixar de prestar um testemunho, na hora em que V. Exa. se despede, que é o testemunho da saudade, é a voz do sentimento, a voz do afeto, a voz dos vínculos mais íntimos que podem unir as pessoas.
O SR. MANOEL DE ALMEIDA - Muito obrigado.
O Sr. Geraldo Guedes – Queria dizer que V. Exa., na verdade, não foi menos pai de família do que Deputado nem menos Deputado do que pai de família. Sempre foi um homem igual, devotado à causa pública, preocupado com o bem geral e possuidor de dotes excepcionais de inteligência e cultura, ressaltados nos projetos apresentados por V. Exa., que se converteram em lei, voltados para a infância, para a juventude, para o amanhã, para os pequenos pobres, para aqueles sem bênçãos de mãe ou apoio de pai, que nada tem na vida senão uma proteção que não sabem de onde vem. Lembrou-se V. Exa. dessa gente, fazendo com que, através de lei, fosse criado um serviço social para assistir o menor abandonado. Os traços da sua personalidade, a sua atenção como homem público, não sou eu quem deve ressaltar. Eles estão presentes na sua vida. Aqui, venho congratular-me com V. Exa.,pois sei que, lá fora, no convívio de sua família, o nobre Deputado há de deixar mais uma vez marcada a sua atuação. Aqui, na Câmara, ficarão o registro e o testemunho do seu trabalho, realmente importante para o desenvolvimento do nosso País. Para os grandes problemas que antevia examinava, tinha sempre uma palavra, uma sugestão, uma idéia, um caminho, um roteiro. Portanto, longe de dizer que V. Exa se vai para não fazer nada; acho que V. Exa se vai para fazer muita coisa.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA - Mudo apenas de trincheira, nobre deputado. Ouço com muito prazer o Deputado Bias Fortes.
O Sr. Bias Fortes – Sr. Deputado Manoel de Almeida, nós mineiros,que conhecemos de perto sua vida pública, que sabemos da sua dedicação às causas de nosso Estado, de nosso País e, em especial, à causa do menor abandonado, queremos no instante em que apresenta suas despedidas, dizer-lhe que V. Exa. dignificou Minas Gerai, enalteceu o homem público do Brasil.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA - Muito obrigado a V. Exa. pela sua generosidade. Tenho a honra de ouvir o grande tribuno dos pampas, meu presidente, Deputado Carlos Santos.
O Sr. Carlos Santos – Meu nobre Deputado Manoel de Almeida, tenho a impressão de que trago, aqui, a outorga de 25 milhões de menores carentes e abandonados, espalhados por esse Brasil afora.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Falarei sobre isso na oportunidade
O Sr. Carlos Santos – São menores dos quais as gerações vindouras não terão o direito de exigir responsabilidades em face dos compromissos com a vigente sociedade de sua Pátria, porque foram subestimados no nascedouro, marcando esse problema tremendo que está aí – o da marginalização do menor. Foi nesse setor, meu caríssimo amigo Manoel de Almeida que aprendi a admirá-lo como homem extraordinário que, na sua terra natal, a lendária Minas Gerais, se dedicou de corpo e alma ao problema da criança, essa criança que é a perenização do homem; que trouxe para a Câmara dos Deputados essa mística, deixando plasmada nesta Casa Legislativa a figura extraordinária do benemérito muito mais do que a de um simples parlamentar, que fez de cada instante, de cada minuto, de cada pedaço de tempo ao seu dispor uma preocupação diuturna, incansável com os menores do Brasil. Eu diria que estava aqui com a outorga, meu caro e nobre Deputado, de agradecer a V. Exa. a magnífica contribuição que deu como Relator, à CPI do Menor. Invoco o testemunho do nosso companheiro Ruy Côdo, que também participou daquela Comissão, para ressaltar a atuação de V. Exa. que ali estava, todos os dias a indagar a perquirir, a dialogar com os depoentes que vinham trazera sua inestimável colaboração. V. Exa. deu um tom todo especial à Comissão. Posso dizer que todo o brilho do nosso trabalho – trabalho considerado um dos melhores do gênero, até hoje, apresentados nesta Casa – deve-se V. Exa, ao seu espírito, a sua inteligência a esse apostolado com que V. Exa. se dedicou aos menores carentes e abandonados do nosso querido país. Quero saudá-lo neste instante e dizer do pesar com que a Câmara dos Deputados vê o ilustre companheiro não ser reconduzido ao cargo, à posição que sobremodo honrou e dignificou. E muito mais do que esta Casa, lá fora, digo e repito, estão os 25 milhões de menores abandonados e carentes, suas famílias, seus amigos, lastimando também que o grande Deputado Manoel de Almeida não possa continuar lutando, aqui dentro, em favor das crianças do Brasil, e favor dos nossos pequeninos irmãos, tão sacrificados no próprio nascedouro da vida. Tenho a certeza de que não será necessária a tribuna desta Casa para que V. Exa. continue nesse apostolado, meu nobre Deputado, pela grandeza maior do Brasil de amanhã, hoje retratada nos infelizes patrícios, digo assim, que formam essa legião infinda, essa legião sofrida de menores carentes e abandonados.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Com justificada emoção, agradeço a V. Exa. grande Deputado Carlos Santos.
O Sr. Genival Tourinho – Permite V. Exa., Deputado Manoel de Almeida, um aparte?
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Com prazer, nobre conterrâneo e amigo.
O Sr. Genival Tourinho - Nobre Deputado Manoel de Almeida, a estima que tenho por V. Exa., bem o sabe é a mais profunda possível. Ainda menino, aprendi a admirá-lo através da admiração que meus pais tinham por V. Exa. Somos ligados, inclusive por laços familiares, seus primos são meus primos. O processo de formação de V. Exa., homem do sertão, homem das barrancas do São Francisco, foi idêntico ao meu...,
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Exato.
O Sr. Genival Tourinho – Se a minha estima já era conhecida por V. Exa., ainda não tinha tido eu a oportunidade de externar a profunda admiração que sempre senti pela sua simplicidade, pelo seu espírito combativo, por tantas obras que realizou em favor do Estado de Minas Gerais. Deputado Manoel de Almeida, a nossa atividade parlamentar, tão fluídica, algumas vezes par nos inexpressiva, porque não sentimos imediatamente os resultados em V. Exa. sempre se consubstanciou de maneira impressionante. Podemos apontar a sua participação em Três Marias, obra extraordinária de Juscelino Kubitschek de Oliveira, podemos apontar a sua presença pujante naquela obra extraordinária de Caio Martins, que transformou V.Exa numa legenda viva do sertão de Minas Gerais. Nos últimos 25 anos, não houve momento de vida política das Minas Gerais a que V. Exa. não estivesse presente e não tivesse deixado marcado, com determinação, coragem e acentuado espírito público, o seu nome, o sobrenome de sua gente, o homem do sertão em última análise Lamento esteja V. Exa. se despedindo desta Casa. Estou realmente comovido,pois, repito, a minha estima por V. Exa. foi adquirida através da estima que meus pais sempre lhe dedicaram. Cumprimento V. Exa. e, no momento em que esta Casa perde o seu convívio, quero dizer que o seu nome está inserido aqui definitivamente, como inserido está na sensibilidade de todo o povo, de toda a gente de Minas Gerais.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Agradeço a V. Exa. a bondade do aparte, e afinco-lh ser recíproca em intensidade a amizade que lhe devoto.
O Sr Ruy Côdo – Nobre Deputado Manoel de Almeida permita-me que, genuflexo, também ocupe esta tribuna de apartes, com o coração em pranto. Comecei a admirar V. Exa. nesta asa, quando da oportunidade em que foi Relator da CPI do Menor Abandonado, da qual participei, ao lado do Presidente Carlos Santos e de outros tantos companheiros, que tratamos do problema do menor carente em nosso País. Temas como este merecem desta Casa e do Governo atenção toda especial. Este é o derradeiro discurso que V. Exa. profere na legislatura que se encerra. Tenho a certeza de que o eco de suas palavras terá ressonância durante a ausência de V. Exa. O seu relato na CPI constitui verdadeiro monumento, no qual terá V. Exa V. Exa. o nome inscrito em bronze e mármore. Na qualidade de paulista, cumprimento V. Exa., em nome das crianças que vivem naquelas favelas abandonadas do meu Estado. Na minha Capital, todos conhecem perfeitamente as dificuldades porque passam as crianças carentes. Ainda outro dia, nobre Deputado Manoel de Almeida, em São Paulo, a Rede Globo de Televisão – Canal 5 levava a todos os lares brasileiros a informação de que uma favela seria transferida para um bairro. E todos puderam ouvir o protesto daquelas famílias. As crianças que moram naquela favela são como as outras, precisam de escolas, alimentação, etc. Como Relator da CPI do Menor, escreveu V. Exa. lindas páginas. Na semana passada conversava eu com o nobre Deputado Almir Pazzianoto. Dizia-me ele que guardava com carinho esse relatório, na sua gaveta. Fez menção a V. Exa. e a todos aqueles que participaram da CPI do Menor. Jamais o Brasil esquecerá jamais a criança brasileira deixará de recordar-se, principalmente o menor carente, que tem em V. Exa. um símbolo que dignifica este País. Haveremos de lutar, nesses quatro anos, na sua ausência, por esse ideal, sempre levando bem alto o nome de Manoel da Almeida.
O SR. MANOEL DE ALMEIDA – Muito obrigada a V. Exa.
O Sr. Paulino Cícero – Nobre Deputado Manoel de Almeida, não desejo privar a Casa de continuar ouvindo o magnífico discurso de V. Exa. Apenas quero lembrar que o Congresso Nacional é um universo de assuntos e de interesses. Realmente, é muito difícil que o parlamentar, em aqui chegando, não se perca entre tantos escaninhos, entre tantos labirintos de assuntos e temas que lhe são propostos. Poucos são aqueles que seguem, efetivamente, uma Ursa Maior uma direção indesviável na sua ação parlamentar e no seu trabalho político. V. Exa., Deputado Manoel de Almeida, é um desses homens que, sendo polivalente para tratar de todos os grandes assuntos nacionais que por esta Casa desfilaram ao longo das últimas duas décadas, teve, no entanto, um denominador comum de preocupação com um tema que consumiu toda a sua vida. É necessário, realmente, que o parlamentar possua visão de perspectiva e até visão de prospectiva, para ter essa diretriz comum. E, no trabalho em prol do menor, V. Exa soube consagrar a sua vida a um tema. Por isso, o afastamento físico de V. Exa. desta tribuna e desta Casa não significará a marginalidade de um tema que V. Exa. soube resgatar. Eu nome será honrado nessa tribuna, neste plenário, nas Comissões desta Casa, lembrado por quantos transformem o problema do menor na grande preocupação de todos os brasileiros. Fica a nossa homenagem a V. Exa., especialmente o carinho, a nossa estima, o nosso afeto, a nossa amizade por tudo que, ao longo desses últimos 8 anos, pudemos aprender do seu patriotismo, da sua dedicação, da sua vocação para a vida pública.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Agradeço a V. Exa., o aparte, Deputado Paulino Cícero.
O Sr. Homero Santos – Permite-me V. Exa. um aparte?
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Com muita honra, nobre Deputado Homero Santos.
O Sr. Homero Santos – Ilustre Deputado Manoel de Almeida, ainda me recordo de quando, deputado estadual, desejoso de também fazer parte da bancada federal de Minas Gerais, consultava V. Exa. sobre a conveniência ou não da minha vinda para esta Casa. Lembro-me muito bem que V. Exa. me disse, naquela época que esta Casa era uma grande escola da vida pública. Hoje estou mais convencido do que nunca de que é realmente uma grande escola, porque aqui pude conhecer um grande professor, um grande mestre: Manoel de Almeida.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Agradeço a V. Exa.
O Sr. Homero Santos – Nesta hora, V. Exa. não se está despedindo desta Casas, porque auqele que constrói o que V. Exa. construiu em benefício de Minas Gerais e do Brasil continuará marcando sua presença, com a sua inteligência, com o seu trabalho, em benefício do menor abandonado, daqueles homens das barrancas do São Francisco, daquela gente sofrida do Nordeste de Minas Gerais. Contou V. Exa. sempre, ao seu lado, com sua digníssima esposa, Da. Márcia, e sua família, que tanto honra a amizade que nos une. Ilustre Deputado Manoel de Almeida, quero continuar a ser aluno de V. Exa., que deu demonstração do que um homem é capaz de realizar me benefício do engrandecimento deste grande País e de nossa querida Minas Gerais.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Muito obrigado a V. Exa. pelo aparte que tanto me comove.
Prossigo, Sr. Presidente.
Assim, chegamos ao penúltimo período legislativo, quando apresentei o Projeto de Lei no. 1.207/73, que resultou na Lei no. 6.218/75, a lei que inclui 22.000 km2 de terras mineiras de margem esquerda do São Francisco na área de operação da SUDENE. Por este projeto modifica-se a fisionomia geoeconômica dos Municípios de Januária, São Francisco e Manga. Os resultados disso pertencem ao futuro próximo.
Finalmente, a obra de maior significação em que tive a honra de participar – a CPI do Menor, a respeito da qual se justificam alguns breves considerações.
A CPI do Menor originou-se do requerimento do eminente Deputado Nelson Marquezan, de 29 de abril de 1975, com o apoio de grande número de signatários. Investigou, com rigor científico e realismo crítico, toda a complexa fenomenologia da marginalização social brasileira, abrangendo um conjunto de múltiplas variáveis inter-correlacionadas, com, entre outras, a composição e volume da população, as migrações internas, a urbanização, a capacidade aquisitiva, a precariedade das condições de vida de vastos setores demográficos em termos de subnutrição, doenças escolaridade, habitação, subemprego, desemprego, desagregação familiar, inoperância dos órgãos responsáveis, e assim por diante.
Depois de quase um ano de atividades permanentes, sob a lúcida presidência do nobre Deputado Carlos Santos, logrou a CPI do Menor encerrar com pleno êxito os seus trabalhos no dia 1ª. de abril de 1976.
Em seguida, ocorreu o encaminhamento ao Chefe de Poder Executivo da União do documento conclusivo dos trabalhos, intitulado “A Realidade Brasileira do Menor”, autêntica radiografia de uma situação transformada, nestes últimos anos, em calamidade nacional.
Trata-se indiscutivelmente, de uma decisiva contribuição do Poder Legislativo, em condições de capacitar o Governo Federal a enfrentar o desafio e tomar as decisões básicas exigidas pela situação.
Coube-se a insigne honra de ser escolhido relator dessa comissão, cujo trabalho ver, mercê de Deus, conscientizando e despertando as forças vivas da sociedade, ensejando condições favoráveis a uma ampla mobilização nacional contra as catastróficas conseqüências da marginalização social das famílias pobres, dos menores e das crianças de nossa Pátria.
Conforme tem sido amplamente reconhecido, “ A Realidade Brasileira do Menor” preconiza em suas conclusões projetos e recomendações devidamente apoiadas em pesquisas e estatísticas fidedignas, uma verdadeira resolução, tanto na órbita governamental como na esfera da participação comunitária e do empresariado, em geral, a fim de evitar que 25 milhões de menores carentes, dos quais cerca de 2 milhões considerados tecnicamente abandonados, já nas fronteiras ou mesmo presa da delinqüência e da criminalidade, possam levar ao colapso a segurança social do País, obstaculiza e inviabilizar o desenvolvimento nacional, além de gerar intoleráveis tensões psicossociais e envergonhar o Brasil perante o mundo civilizado. Verifica-se, por conseguinte, que o Congresso Nacional já cumpriu o seu dever e fez o que lhe competia fazer ao encaminhar ao Sr. Presidente da República, nos termos da Resolução no. 21, de 23 de junho de 1976, as conclusões e a recomendação especial do CPI do Menor – através do documento, elaborado com a máxima seriedade e espírito prático, no qual se contêm além dos diagnósticos definitivos, as proposições concretas, os programas, projetos e providencias objetivas que a Nação vem exigindo.
Diante desses ameaçadores problemas não mais se justificam planejamentos redundantes ou medidas procrastinadoras.
Urge dar imediata execução às providências, exaustivamente estudadas pelo Poder Legislativo no decisivo documento, já encaminhado às autoridade às autoridades responsáveis.
Qualquer protelação teria, na realidade, o sentido de uma sabotagem – porque não dizê-lo? – contra o povo e o Congresso Nacional. Sabotagem insidiosamente levada a efeito pela tecno-burocracia interessada na manutenção do status quo dessa área da administração pública.
Sr. Presidente, Srs., Deputados, o povo brasileiro já está habituado – entre perplexo e traumatizado – a acompanhar, através dos jornais, radio-emissoras, estações de TV e revistas, a sucessão de tragédias consubstanciadas nas reportagens, estudos, notícias e filmes relativos à terrível situação em que se encontram a infância e a juventude desassistidas, cujo problemas se agravam exponencialmente, adquirindo proporções explosivas, com se depreende dos indicadores estatísticos que evidenciam estarem as nossas regiões metropolitanas e principais aglomerações urbanas demograficamente saturadas, ecologicamente poluídas e socialmente deterioradas.
A análise imparcial dos indicadores estatísticos da nossa conjuntura sócio-econômica, dominada pela marginalização de vastos segmentos da população, evidencia a sua periculosidade imanente, notadamente no referente aos índices de violência e criminalidade.
O Sr. Jairo Magalhães – Nobre Deputado Manoel de Almeida, pretende V. Exa. pelo que vejo, reunir, na despedida que faz, os esforços desdendidos, os obstáculos vencidos, os êxitos afinal, de um período longo e sua existência. Estou convencido de que não o conseguirá, dada a exigüidade do tempo e, sobretudo, a intensidade da obra que deixa á posteridade. Eu, que de há muito tempo observo o trabalho de V. Exa., posso hoje, dar o testemunho de que em instante algum o vi descer da tribuna de defesa dos altos interesses nacionais, especialmente atento e sensível ao grande e preocupante problema do menor. Sem dúvida, tem sido empolgante o trabalho de V. Exa. Estou convencido por outro lado, de que tantas foram as lições, tantos e tão edificantes foram os exemplos de V. Exa. nesta Casa, que teremos nós outros, na perseguição desses mesmos exemplos e dessas mesmas lições, de contribuir de algum modo para a concretização das inspiradas pretensões de V. Exa. na busca do equacionamento desses mesmos problemas. Estão de parabéns Minas e o Brasil pelo Parlamentar que passou por esta Casa com intensidade de propósitos e de trabalho, e congratulo-me comigo mesmo pelo privilégio de ter sido colega de V. Exa.
O SENHOR MANOEL DE ALMEIDA – Muito obrigado pelo honroso aparte. A própria imagem do Brasil perante as nações do mundo civilizado encontra-se lamentavelmente deformada e aviltada, a ponto de ser objeto das opiniões deprimentes e constrangedoras dos que nos julgam condenados ao pauperismo irremediável, como um País frustrado, envolvido na zona de sombra do subdesenvolvimento crônico, em face da existência, no seu vasto território, de milhões de párias que apodrecem em condições infra-humanas de existência.
Em síntese, generaliza-se a convicção de que somos um projeto inviável de nação, apesar de suas imensas e reconhecidas potencialidades – um País cujas elites governamentais não foram capazes de transformá-lo naquela potência que já devia ser neste crepúsculo do século XX.
O Brasil não se conforma, todavia, com a incompetência, a alienação e a insensibilidade do complexo tecnocrático que permanece estagnado diante desses problemas – todos já equacionados, diagnosticados e divulgados pela CPI do Menor, no bojo do seu relatório conclusivo.
Refiro-me, Sr. Presidente, especificamente aos baronatos, feudos e satrapias que constituem o emaranhado dos órgãos descoordenados e inoperantes, supostamente responsáveis pela assistência, bem-estar e a formação das crianças e menores do Brasil. Contudo, ainda mais nefastos, porquanto mais empavonados e insensíveis, são os responsáveis pelas decisões relativas à denominada Política Nacional do Menor, situados nos altos escalões governamentais, em áreas estratégicas da administração federal. Não compreendo como tais personagens possam dormir tranqüilos ou digerir suas rendosas sinecuras, mordomias e privilégios, enquanto vinte e cinco milhões de menores carentes estão se transformando, diante de nossos olhos, num perigoso exercito dos proscritos e marginais, destituídos de religião, sem qualquer profissão, subnutridos, doentes e cada vez mais ameaçadores - a terrível gangrena que progride no organismo nacional e ameaça a própria sobrevivência do Brasil como nação civilizada.
Nesse complexo de incúria, desídia e fracasso típico das entidades, órgãos e serviços responsáveis pelos destinos da infância e da juventude marginalizadas, encontram-se apé mesmo os Juizados de Menores – todos eles impotentes, sem recursos humanos e materiais, meras etapas interlocutoras, burocratizadas, que se limitam a encaminhar os menores às FEBENS ou a uma FUNABEM, por sua vê reconhecidamente sub-dimensionada e incompetente. Veja os fatos para julgamento dessa assertiva.
A esse respeito, tive a oportunidade de denunciar à Nação, desta mesma tribuna, em discurso publicado no Diário do Congresso Nacional, precisamente de 12 de dezembro de 1976, com documentos irresponsáveis, a calamidade nacional representada por esta constelação de órgãos inoperantes que iludem a opinião pública e ostentam uma fachada mistificadora – inclusive, muitas entidades particulares – e que, de vê em quanto, são objeto de denúncias e inquéritos pela desídia, precariedade de instalações e péssima qualidade de atendimento proporcionados aos que lhes são encaminhados pelos Juizados de Menores – repartições, via de regra,estagnadas, notoriamente omissas e policialescas.
Talvez por isso mesmo é que a crônica policial vem estarrecendo a opinião pública em todas as cidades importantes do país com o cotidiano relato em crimes pavorosos, praticados com requinte de perversidade, cujos atores são menores egressos da FUNABEM, como recentemente em casos ocorridos no Rio de Janeiro e São Paulo.
Aqui mesmo, no Distrito Federal, a cidade erigida sob as inspirações de uma profecia de Dom Bosco, espantosas atrocidades vem sendo cometidas, como por exemplo, a recente chacina na então pacata cidade-satélite do Gama – cujos autores foram ex-presidiários de 18 anos de idade.
Desnecessário se torna invocar, nesta oportunidade, números e indicadores, já exaustivamente analisados no Relatório da CPI do Menor. Não é mais possível regredir à inocuidade das soluções parciais isoladas e superficiais, características do status quo.
Convém, no entanto, relembrar que a progressiva marginalização de vastos segmentos de uma população global, então calculada em 108 milhões de habitantes – 60% dos quais concentrados em áreas urbanas, congestionadas e saturadas – ameaça tornar-se irreversível em face das taxas de incremento demográfico da ordem de 2,9 a 3,1% ao ano.
Ocorre ainda que 52,92% da população situa-se na faixa de 0 a 19 anos de idade, enquanto 2/3 da população assalariada – cerca de 18,5 milhões de trabalhadores – auferiam rendas inferiores a 1,5 salário mínimo, gravíssima insuficiência, classificada pelo relatório como matriz geradora do processo marginalizante.
Sem sombra de dúvida, não havia outra alternativa senão inovar com arrojo, como fez a recomendação-síntese, aprovada pela unanimidade da ARENA e MDB e submetida ao Sr. Presidente da República – a abordagem sistêmica que possibilitaria evoluir do empirismo dos paliativos superficiais e medidas inadequadas, tangenciadoras do problema, para o estágio superior de uma completa mobilização nacional, da mesma natureza de uma guerra, capaz de erradica o mal que ameaça a Pátria. “Ou então – afirma o Relatório da CPI do Menor – chegaremos ao ano 2000 na condição d uma potência frustrada, ingovernável, socialmente atrasada e internacionalmente desmoralizada, como gigante sul americano de pés de barro...”
A corajosa abordagem proposta está contida no elenco das providências integradas na mencionada recomendação-síntese a que se refere o Projeto Dom Bosco – vanguarda e instrumento do Sistema do Menor, com seus objetivos gerais, metas prioritárias, mecanismo executivo, setores escalonados de atuação e dimensionamento dos recursos necessários.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, é com justificada emoção que, depois de longa trajetória de initerrupta atuação política no âmbito do meu Estado, durante mais de 30 anos, dos quais 24 de sucessivos mandatos como Deputado, sendo 20 nesta Casa, assomo à magna tribuna do Congresso Nacional, não para uma despedida, porque a minha luta prosseguirá sem quartel em outras frentes de batalha, mas para, de cabeça erguida e consciência tranqüila, reafirmar a minha convicção inabalável no bom sucesso e pleno êxito dos objetivos visados.
Porque, sem falsa modéstia, sinto ter desempenhado, com patriotismo e dedicação aos superiores interesses do País, as difíceis missões que me foram confiadas pelo bravo e querido povo de Minas Gerais. A ele, portanto, à minha terra e a à minha gente a mais profunda gratidão. Aonde quer que o destino conduza, nesta nova caminhada que inicio com mesmo entusiasmo de outrora e a energia de sempre, permanecerei atento e fiel aos interesses e apelos, nos parâmetros do ideário que tem orientado todos os meus passos, desde a juventude interiorana até ao presente momento, quando retorno, por assim dizer às minhas origens e ao espaço onde se desenrola a existência do homem do povo. Sem levantar, nesta hora, quaisquer valores negativos, com a mente lúcida, em condições de entender minha Pátria e o meu povo, regresso às duras pelejas do cotidiano, perenemente engajado no bom combate contra o pauperismo das massas rurais, no desenvolvimento do interior, a melhoria das condições de vida do povo e, sobretudo, na erradicação das causas e efeitos dessa trágica marginalização dos menores, crianças e famílias carentes e desassistidas de nosso País, que são os milhões de seres humanos despojados, por vezes até mesmo, da esperança de sobreviver. Desejo igualmente, apresentar, aos meus bravos e diletos colegas, companheiros de tantas lutas e debates do plenário – muitas vezes sacudidos pela veemência retórica e conflitos dos antagonismos políticos, como nas geralmente tranqüilas, mas altamente produtivas atividades das Comissões Técnicas – as mais efusivas manifestações do meu apreço, compreensão e profundo respeito.
Porque, na verdade, carregam – tanto Deputados antigos que prosseguem, nesta Casa, como os colegas recém-advindos – tremendas responsabilidades enfrentando praticamente idênticos desafios.
Que a Providencia Divina nos proteja a todos igualmente, a fim de que possamos desempenhar a nossa missão com dignidade, eficiência e honradez.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. (Palmas, O orador é cumprimentado.)

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

MENSAGEM AOS FORMANDOS DE JANUÁRIA (sem data)

Prezados afilhados,

Recebi há cerca de dois meses a honrosa incumbência de paraninfá-los no ato solene da 8ª série do Curso Fundamental. Durante todo o tempo decorrido, até o dia de ontem alimentei a esperança de poder me dar grande alegria de estar presente, para lhes falar dialogando a última aula, em que devia, em palavras singelas e objetivas, indicar-lhes o caminho a seguir, a partir de agora, quando se lhes despontam novos horizontes, para as conquistas que a vida impõe.
Educar, já disse alguém de grande lucidez, “é a razão de ser da vida”. Doar nossas reservas humanas para a realização do sublime mandato, o dever precípuo do pai, do mestre, do homem dentro da sociedade.
Eis que a existência na integração dos fatores que a constituem, está aí, a oferecer imensa gama de oportunidades, a ensejarem a aprendizagem e a formação da juventude.
Pondo de parte aquilo que o aluno recebe, observamos como Aguayo, que muito maior ensejo ele tem de aprender, pelo exemplo edificante ou pelas práticas de comportamento que deve refletir, através do que o grande educador, denominou de educação reflexa.
Esta, realmente, muito antes dos processos convencionais de aprendizagem cognominada “moderna” já atuava com eficiência e durabilidade, de pai para filho, de mestre para aluno, transportando a tradição do passado à atualidade contemporânea do aluno, e fazendo do tempo e do espaço geográfico, a unidade que os povos recolhem e transmitem ao futuro como contexto de civilização, em fronteiras ou limitações cronométricas.
Aí, vamos deparar, objetivamente as grandes obrigações que nos vinculam, nós os homens unidos à terra co certa antecedência – ao dever de observarmos uma conduta que sirva de exemplo, conforme postulam os mestres para a distinta e promissora juventude. E esses exemplos, começam no lar, lá tem seu reinado organizado na Escola, mas estão presentes em todos os momentos, nos relacionamentos de vida prática, onde que se encontra a criatura humana, em todos os acontecimentos, seja os conceitualmente da ordem positiva, ou os da ala negativa.
Aprende-se, enquanto se lê uma página em que são relatados fatos que promovem o ser humano pelo esforço honesto; aprende-se enquanto se testemunha e julga os fatos de um pleito eleitoral, onde controvérsias e distúrbios de conduta estão de permeio com o entrechoque do entrevero político, ressaltando o belo, o ideal a ser seguido e, igualmente, aquilo que devemos indicar à posteridade como o procedimento que detém o progresso da humanidade. Aprende-se finalmente, em tudo que nos cerca, na maneira de agir de um juíz, numa partida esportiva, e muito mais, ainda, pode-se conhecer o homem, e saber o que dele devemos imitar, nas páginas que a imprensa dedica aos atos anti-sociais e ao crime.
Meus queridos afilhados:
Tudo isso e muito mais, mormente, no que se refere às preocupações da vida profissional, que se seguem ao estágio, que estão concluindo – eu devia lhes dizer, de viva voz, não fora a imperativa determinação indica que após a campanha eleitoral, o pleito, me obrigou a obrigatório recesso para tratamento de saúde, inadiável, considerando o excessivo esforço que realizei no último pleito.
Solicitei, entretanto, a um jovem, rebento de nova geração que me representasse, falando por mim aos nossos conterrâneos da significação do alicerce que acabam de formar, para o edifício futuro de suas existências. É o Naylorzinho. Ele dirá por mim, Ele que conheceu de perto o meu esforço do último mês, lhes pedirá perdão por essa imperdoável ausência.
Que o Criador os oriente para um destino que faça honra à tradição da fibra sertaneja e seja resposta às necessidades de nossa gente.

Afetuosamente,

1964-1965

SALMERON, Roberto A. A universidade interrompida – Brasília 1964-1965, Editora UnB, p. 338 a 345

“Estamos vivendo crise desde a revolução de abril. Esta é a verdade. Enquanto houver este ambiente de desconfiança, de olheiros na Universidade, tomando nota, aparecendo listas de professores que vão ser demitidos, não será possível um trabalho tranqüilo. Vossa Magnificência, como professor universitário, posto neste cargo pela revolução, por conseguinte, de confiança das autoridades, deveria fazer ver a essas autoridades militares que isto que estão fazendo na universidade é absolutamente incompatível com um trabalho universitário serio...” Eu participei desse clima, todos os dias chegava alguém e dizia “Olha o professor fulano está na lista. Você está com o nome na lista”. Vossa Magnificência, como professor há de entender, que não é possível. A origem de toda esta crise é exatamente esta, ao lado das deficiências materiais que o Professor Zeferino Vaz apontou em seu depoimento. Essas, as verdadeiras crises da Universidade, não é o afastamento do atual Reitor que vai solucionar, o que vai solucionar é exatamente o fim desse clima, o fim de toda essa apreensão que domina os atuais professores, bem como aqueles que para cá se transferirem sob vigilância das autoridades militares, vendo na Universidade de Brasília um foco de subversão capaz de constituir ameaça aos três Poderes da República.
O deputado e professor Roberto Saturnino definiu a situação com precisão.

Um deputado fala como pai de alunos da universidade e mostra as contradições nas palavras alarmantes do Reitor.

O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Senhor Presidente, Senhores Deputados, Magnífico Reitor, uso da palavra hoje não apenas como Deputado, mas como pai de dois filhos que estudam na Universidade de Brasília, sentindo pois o problema que sentem outros pais, que não tem a oportunidade de dialogar com Vossa Magnificência. O nosso trabalho em favor da Universidade de Brasília se iniciou ainda no velho Palácio Tiradentes, quando depois de uma visita feita a Brasília, tivemos a oportunidade de, ocupando a tribuna, lançar algumas palavras aos pais que para cá deveriam vir”.. “Foi assim que começamos a nos bater pela Universidade, e essa luta nos vincula ao problema e nos dá responsabilidade para hoje aqui tratar do assunto com Vossa Magnificência”... “Como pai de dois filhos, eu aqui deponho para Vossa Magnificência, nunca ouvi na minha casa, dos meus filhos, qualquer manifestação a respeito de qualquer assunto que pudesse denunciar vinculação a esquerdismo ou qualquer processo de agitação dento da Universidade. Converso com meus filhos como se fossem irmãos, aprendo com eles, troco idéias a respeito de todos os problemas, e qual não foi a minha surpresa quando tive conhecimento de que a Universidade de Brasília estava sendo causa de intranqüilidade nas famílias de Brasília. Ora, eu que vivo em Brasília desde o início – cheguei aqui antes da inauguração –, que tenho convivência fraterna com meus filhos, com filhos de outros companheiros e de funcionários que freqüentam a nossa casa, não pude entender a veracidade dessa expressão, que teria vindo de Vossa Magnificência, de que a Universidade teria sido ocupada para evitar a intranqüilidade nas famílias de Brasília. Os jornais disseram fartamente, no dia seguinte ao da ocupação”.

O Sr. Depoente – “Devo dizer a Vossa Excelência, Deputado, que o meu propósito e as medidas, que reconheço enérgicas, que tomei, foram com o objetivo de impedir fatos de ocorrências piores. Talvez não deva divulgar certas informações que me chegam ao conhecimento ,porque não posso responder pela veracidade delas, mas ainda continuo preocupado, porque surge uma informação de que se vai tentar uma agressão a um professor, surgem informes os mais variados , que podem ser boatos, mas que soa elementos que causam intranqüilidade, pelo menos àqueles professores que não se demitiram e que chegam até a pedir garantias à Reitoria e responsabilizar a Reitoria por quaisquer danos nos seus departamentos.”

O Sr. Deputado Manoel de Almeida - “Eu desejava fazer algumas perguntas que anotei, e pedia a colaboração de Vossa Magnificência. Porque demitiu os Professores Antônio Cordeiro, Jorge Guimarães e Reinaldo Magalhães?”

O Sr. Depoente – “Eu á informei, numa reunião anterior, que esses professores foram demitidos por motivos exclusivamente disciplinares. Foram apontados como elementos que tiveram uma participação maior ou menor no ambiente de agitação e na deflagração da própria greve da Universidade de Brasília.”

O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Vossa Magnificência poderia individualizar os fatos em relação aos três?”

O Sr. Depoente – “O que posso dizer evidentemente é um fato – é que procurei me informar se por acaso alguns desses professores teriam sido detidos por palavras que teriam sido pronunciadas no campus da própria universidade, e se fora em função de afirmações feitas.”

O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Palavras que teriam sido...”

O Sr. Depoente – “Proferidas em termos de planejamento com atos de represália para com os militares que estavam no campus universitário.”

O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Vossa Magnificência conhecia esses professores antes?”

O Sr. Depoente – “Conheci o Professor Cordeiro como Coordenador, em contatos que mantive com ele em reuniões com Coordenadores.”

O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “E considerava esse professor capaz de uma atitude dessas?”

O Sr. Depoente – “Seria inimaginável que eu pudesse admitir que esse professores universitários, exclusivamente em assuntos universitários, tomassem atitudes como tomaram. O Professor Cordeiro foi um dos professores, na assembléia, favorável a uma greve de 24 horas na Universidade. A respeito desse assunto eu quero insistir em que, se houve injustiça, o problema hoje está na alçada da própria Presidência da República que chamou a si o exame desses fatos.”

O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Vossa Magnificência não ouviu esses professores antes de demiti-los?”

O Sr. Depoente - “Não ouvi. As demissões a que procedi, procedi em termos apenas invocando atribuição estatutária, que me confere a faculdade de zelar pelo regime disciplinar da Universidade. Isso não significa, em nada, um desapreço à posição ideológica desses professores ou às atividades científicas por eles exercidas. Eu entendo que minha atitude é uma atitude que resguarda até esse professores, de certa forma, porque amanha não se poderá dizer nas repartições a que servem, que foi uma demissão por motivos ideológicos ou por motivos de agitação, ou disso, ou de qualquer outra razão que não acadêmica.”

O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Vossa Magnificência, quando se referiu a esse movimento, talvez quisesse fazer referência a um complô que se preparasse, arquitetado lá não sei contra quem, contra professores de lá de dentro ou pessoas estranhas à Universidade?”

O Sr. Depoente – “As informações são várias Para que não aumentassem esses motivos de inquietação, eu pediria ao eminente deputado que me escusasse de responder a essa pergunta. Pessoalmente, eu poderia responder a Vossa Excelência.”

O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Apenas eu desejava saber desde já se foi esse o motivo, essa informação, que determinou essa demissão?”

O Sr. Depoente – “Foram várias as informações que eu recebi, informações sobre elementos da Universidade e de elementos de fora.”
O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Vossa Magnificência tem isso por escrito?”
O Sr. Depoente – “Não tenho aqui, mas tenho, por exemplo,os depoimentos prestados pelos professores presos. É um dos elementos por escritos que tenho.”
O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Professores presos?”
O Sr. Depoente – “Que foram presos. “
O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Qual foi o motivo dessa prisão?”
O Sr. Depoente – “Exatamente esse o motivo.”
O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Essa suspeita.”
O Sr. Depoente – “Não. Foram palavras proferidas no campus por professores, de incitamento a uma atitude de represália contra os militares que lá estavam, que deveria provocar uma reação desses soldados, e, a partir daí, estudantes e professores, solidários, se encaminhariam ao Congresso, a esta Casa, para mostrar estudantes espancados e agredidos. Essa informação que chegou ao meu conhecimento. Se isso foi dito por brincadeira, se isso foi dito simplesmente para aumentar a agitação, é outro problema, mas essa informação chegou ao meu conhecimento.”
“A segunda parte da operação efetivamente se realizou houve uma interferência de professores no Supremo Tribunal, no Departamento Federal de Segurança Pública e, depois, a presença nesta Câmara. Isso é público e notório.”
O Sr. Deputado Manoel de Almeida exprime a sua incredulidade com a pergunta: “Desejavam os professores expor os alunos ao espancamento por parte das autoridades, para depois virem a esta Casa mostrar os alunos machucados? Era essa a idéia?”
O Sr. Depoente – “As minhas informações chegam até esse ponto, mas Vossa Excelência pode dirigir-se às autoridades militares, que podem esclarecer.”
Essas respostas mostram que Laerte Ramos de Carvalho estava circundado por um ambiente de delírio, onde ele, seus auxiliares e seus informantes não distinguiam mais a realidade, pois seria necessário que professores estivessem atingidos de insanidade para pensar em fazer com que estudantes fossem atacados, espancados, feridos e exibidos como vítimas.
A chamada segunda parte da operação referia-se a visitas que professores fizeram a membros do Supremo Tribunal Federal, para pedir auxílio na solução da crise, e ao general comandante do Departamento Federal de Segurança Pública, para tentar dissipar essas idéias falsas a respeito da universidade. O reitor poderia ter incluído também visitas a deputados, a senadores, ao prefeito do Distrito Federal e ao general Golbery do Couto e Silva, chefe do SNI, com o intuito de mostrar o que era realmente a Universidade de Brasília. E as audições da Comissão Parlamentar de Inquérito, sendo públicas, abertas a todos os cidadãos, nada mais natural que professores e estudantes assistissem a elas, pois não podiam ficar insensíveis a acontecimentos que afetavam suas vidas.
O deputado passa a ler um documento, que surpreendeu o reitor.
O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Magnífico Reitor, eu tenho em mão um documento que desejava ler, para que conste do inquérito e certamente para conhecimento também de Vossa Magnificência, que não sei se conhece a folha de registro que se refere à passagem desses professores pela Delegacia. O documento é o seguinte:
Raimundo Real Pereira, escrivão substituto do Cartório da 2ª vara Criminal de Brasília, Distrito Federal, em pleno exercício de seu cargo, na forma da lei, certifica, atendendo pedido verbal da parte interessada que, revendo em seu Cartório o processo de habeas-corpus, no. 249 impetrado por D. Marcos Ruiz Neto e Luis C. M. Clerot, em favor de Antônio Cordeiro, Jorge Guimarães, Reinaldo Magalhães e Ênio Melo, dele à fl. 5 verificou constar o seguinte: “Armas da República, Ministério da Justiça e Negócios Internos, Departamento Federal de Segurança Pública, sem número. Em 31-10-65. Do Delegado do DOPS ao Meritíssimo D. Juiz de Direito e Plantão.
Assunto – Informação. Presta.
MM. Juiz de Direito: Em atenção ao ofício sem número do Juizado de Plantão datado de 11 de outubro de 1965, informo a Vossa Excelência que os indivíduos nele citados não foram presos pelo DOPS encaminhados ao Batalhão de Guarda Presidencial à disposição do Comandante daquela unidade militar, mas sim, foram, por ordem do Excelentíssimo Senhor Diretor-Geral do Departamento Federal de Segurança Pública, em exercício, detidos por agente policial do DOPS, para averiguações, por pesar sobre os mesmos acusações de estarem incorrendo em crime contra segurança nacional. Encaminhados à Delegacia-Geral de Investigações, aguardaram a chegada da autoridade ora informante que, após o procedimento das sindicâncias e diligências para elucidação do fato, e após ouvir esclarecimento dos implicados, não encontrou ilícito na conduta dos mesmos. Submetida esta opinião à Direção-Geral do DOPS – Departamento Especial de Segurança Pública – com a sua orientação foram os elementos já citados de pronto liberados pela autoridade informante.
Aproveita o ensejo para renovar a Vossa Excelência, etc.
As respostas que o reitor tinha dado ao deputado: O que posso dizer – evidentemente é um fato – é que procurei me informar se por acaso alguns desses professores teriam sido detidos por palavras que teriam sido pronunciadas da própria Universidade e se fora em função de afirmações feitas, assim como tenho, por exemplo, os depoimentos prestados pelos professores presos. É um dos elementos por escrito que tenho... Essas respostas, e as declarações do reitor sobre fatos que conheceria, não concordam coma conclusão da Direção-Geral do DOPS, que não encontrou ilícito na conduta dos professores. Nada, no documento lido pelo deputado, deixa transparecer as palavras que o reitor tinha atribuído aos professores. O documento oficial da DOPS, órgão que não podia ter suspeito de complacência ou de favoritismo, estava em desacordo com as afirmações de Laerte Ramos de Carvalho.
A prisão daqueles quatro professores está descrita no capítulo “Espionagem, delações e prisões”.
O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Queria saber a opinião de Vossa Magnificência a respeito desse documento.”
O Sr. Depoente – “Estou tomando conhecimento agora deste documento. Mas posso informar que não foi apenas por este motivo que eu decidi pela demissão desses professores. Eu insisto em que o problema não esta na minha alçada, que o problema o Presidente da República chamou para si e que ele poderá receber representações individualizadas, quando os fatos poderão ser inteira e devidamente apurados.”
Tendo o deputado Mario Piva perguntado por que motivo as admissões estariam nas mãos do Presidente da República, o reitor responde:
“Eu não sei quais as razões do Presidente da República para que ele tenha resolvido chamar para a alçada da Presidência da República este problema.
O Sr. Deputado Manoel de Almeida – “Do ponto de vista da autoridade de Vossa Magnificência mesmo,Vossa Magnificência verifica hoje que foi improcedente, conforme se vê desse documento, onde houve investigações, onde ouve trabalho no sentido de elucidação por parte de autoridade, mesmo depois verificado que não houve nada. Se houvesse, estava na hora de apurar. Porque esses homens estavam presos por este motivo, então as diligencias deveriam se processar até o fim, até a elucidação completa. E eles foram postos em liberdade, o que revela a Vossa Magnificência o fato.”
O Sr. Depoente – “Mas, apesar disto, ainda resta, por informação que tenho, a participação grande e intensa no movimento que deflagrou a greve.”
O deputado Manoel de Almeida, com muita elegância, tinha mostrado as contradições nas afirmações do reitor. Termina fazendo-lhe apelo para que levasse ao conhecimento do presidente da República que aqueles quatro professores tinham sido inocentados pela Dops e que fizesse sentir ao presidente que, como eles eram inocentes, talvez também não houvesse nada incriminável a nenhum dos demitidos.
O depoimento de Laerte Ramos de Carvalho mostra que ele assumiu a reitoria com a mentalidade de alguém que tem a missão de combater malfeitores e caracteriza-se pela insistência em banalizar ações repressivas, em todos os níveis. Não abre nem deixa antever nenhuma via para a solução do conflito.
Fazendo declarações à imprensa e na Comissão Parlamentar de Inquérito em que ataca repetidamente professores e estudantes, apresentando a UnB como lugar de indisciplina generalizada e foco de subversão, Laerte Ramos de Carvalho foi outro grande responsável pelo ressurgimento da ideologia sobre a Universidade de Brasília, retomada por certos jornais. E, em respostas, que deu no fim do depoimento, pretende não ser responsável pelos atos que praticara. Dirigia a Universidade de Brasília como representante do governo, como homem de confiança do presidente da República e do ministro da Educação e Cultura. Permaneceu na reitoria dois anos mais, até 3 de novembro de 1967.

1978

Brasília, setembro de 1978.

Companheiro,

Novamente, sou candidato à reeleição à Câmara dos Deputados. Vou continuar a obra que comecei, ainda em nossa gloriosa Polícia Militar, quando, como Chefe de Gabinete do Cel. José Vargas, me bati pela criação das Escolas Caio Martins, do Colégio Tiradentes e pela Reforma do Ensino em nossa Corporação, com reais benefícios, logo sentidos, para a sociedade e para a própria Milícia. Obra que se prolongou, na atividade pública, tanto na Assembléia Legislativa como na Câmara dos Deputados, quando me dediquei à defesa de “Três Marias”, ameaçada de paralização, na época, ou quando colaborei na feitura e aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação e inclui, pelo Decreto 1.207, transformando na Lei 6.128, cerca de 22 mil quilômetros quadrados do noroeste mineiro, na área do Polígono das Secas. Ou, ainda, quando, em ambas as Casas Legislativas, votei-me a esforço sempre com sucesso pela instalação de serviços de água e esgotos, de agencias bancárias e pela eletrificação, em muitas das nossas comunidades do interior.
Na última legislatura, pude participar da CPI do Menor, da Câmara dos Deputados, o que me deu oportunidade de aprofundar os estudos sobre a questão da criança carente. Do esforço, resultou a redação do RELATÓRIO DA REALIDADE BRASILEIRA DO MENOR, que alertou o Sr. Presidente da República para a gravidade desta questão e lhe indicou a melhor solução para o problema.
Mostrou a investigação feita na oportunidade que o drama da criança necessitada tem, entre nós, dimensões de verdadeira calamidade. São 25 milhões de meninos e meninas, de brasileirinhos, que sofrem toda a escala de privações, desde o abandono puro e simples até a falta de alimentação suficiente, de saúde melhor, de escolas e mesmo de carinho. Por isto, proponho-me, se reeleito, bater-me pela instalação do SISTEMA NACIONAL DO MENOR. Sem abrir mão, evidentemente, dos esforços pelo nosso progresso, em todos os setores do interesse social.
Por tudo o que acabe de dizer é que receberia, com especial agrado, o apoio que você me desse sufragando o meu número – 241 – no próximo pleito. Seria, para mim, o voto de um irmão de ideal – o ideal de servir que aprendemos a cultivar nas fileiras de nossa nobre Corporação, toda ela, sabidamente, devotada ao bem público.


Atenciosamente,
Manoel José de Almeida

ESBOÇO DO PROGRAMA DE TRABALHO DO DEPUTADO MANOEL DE ALMEIDA (s/ data)

LINHAS DE AÇÃO:
1. Educação do Povo
2. Desenvolvimento Rural
3. Proteção à Infância
4. Revisão dos Programas do S. Francisco

1. EDUCAÇÃO DO POVO

1. O sistema educacional brasileiro está semi-falido, dadas suas tremendas deficiências quantitativas e qualitativas.
2. Do ponto de vista quantitativo, a situação é calamitosa: há pelo menos 3.000.000 de crianças sem escolas. A Constituição determina que “o ensino primário é obrigatório”. O Código Penal considera crime o fato de um pai não colocar o filho na escola. Mas onde estão as escolas, para esse pai poder cumprir a lei? Se é crime o pai não colocar o filho na escola, não é maior crime deixar o povo sem escolas onde colocar os filhos?
3. Há poucos dias atrás, em plena Capital da República, os jornais publicavam fotográficas de pais, em filas, nas portas das escolas, a fim de conseguirem matrícula para seus filhos, sendo que, em alguns locais, os pais foram para a fila com 24 horas de antecedência, levando marmitas de comida e até camas!
4. Parece, assim, que antes de decretar a obrigação de os pais colocarem seus filhos na escola, as leis deveriam decretar a obrigação de os poderes públicos abrirem escolas para o povo.
5. Ainda do ponto de vista qualitativo, como resultado da carência de escolas e outras dificuldades, o Brasil continua sendo um país de analfabetos. Apesar de todos os cursos para a Educação de Adultos, há, em nosso país, atualmente, pelo menos 33.000.000 de analfabetos!
6. Do ponto de vista qualitativo, não é a melhor situação do ensino brasileiro, ou talvez mesmo seja pior. Sua orientação é teórica, livresca, acadêmica, fora inteiramente fora da realidade. Na maioria das escolas da roça damos apenas uns rudimentos de cultura ao jovem, suficientes para que ele seja eleitor, mas insuficientes para que possa melhorar de vida. As poucas letras recebidas servem apenas para desajustar o indivíduo; para lhe dar consciência da sua desgraça; para despertas nele a ideia de abandonar o campo e vir para a cidade. Mas, sem preparo nenhum, vem ele apenas engrossar a massa dos desajustados sociais e dos favelados.
7. A finalidade da escola é PREPARAR O INDIVÍDUO PARA A VIDA, mas nossas escolas não estão ligadas à vida, não levam em conta o meio ambiente, as necessidades e aspirações da comunidade, de forma que não estão preparando o jovem para viver melhor, mas apenas enchendo sua cabeça de nomes, de números, de datas e de regras, tudo para ser bem decorado, recitado, depois, para o professor.
8. Claro que estamos falando em tese: graças a Deus há escolas que fogem à regra, que educam seus alunos, que os preparam para a vida. Quanto aos mestres, na sua absoluta maioria, são dedicados, dedicadíssimos mesmo, apesar dos parcos salários que recebem. E se melhor não ensinam, é menos por culpa deles do que por falta de assistência e orientação, pois eles vivem abandonados e esquecidos no interior, quase tanto quanto os seus alunos e a população rural.
9. Essa falta de correlação entre a escola e a vida é notável sobretudo no interior do país, onde o ensino é do mais baixo nível que se possa imaginar, tornando a escola um órgão sem prestígio nem força para colaborar no progresso social, como é de sua finalidade.
10. Para agravar esse quadro, saliente-se a constante mudança de professores das escolas do interior. Não apenas ganham pouquíssimo os mestres, como os que são contratados levam, às vezes, um ano inteiro sem receber seus vencimentos. Ficam esses dedicados professores sem recursos, cheios de dívidas, humilhados na localidade e sem força moral para o seu trabalho. Sua preocupação passa a ser receber o magro vencimento e fugir do campo o mais depressa possível. A escola rural representa, assim, uma provação, um penoso estágio, de que o professor procura libertar-se, e não, como deveria ser um ideal de vida, um plano de trabalho, que para ser eficaz, teria de ser continuado e duradouro.
11. Examinados, rapidamente, os defeitos do sistema, apontamos as soluções. A primeira, naturalmente, é multiplicar a construção de prédios escolares, em locais adequados, sobretudo no interior, onde maior é a sua falta.
12. Mas a grande solução é vivificar a escola, transformá-la num organismo mais dinâmico, num fator de progresso da comunidade. Para isso, a escola deve ensinar ao aluno como melhorar de vida. Precisa ser um centro que vibra, trabalha e produz. Temos que fazer, na expressão criada pelo Professor Amaral Fontoura, A ESCOLA VIVA.
13. A ESCOLA VIVA significa que, no interior, desenvolve, com seus alunos, atividades de campo, tais como horticultura, criação de galinhas e abelhas, bem como pequenas atividades rurais.
14. A ESCOLA VIVA significa sua articulação com a comunidade, colaborando por todos os meios, para a melhoria e o soerguimento dessa comunidade; a escola não será apenas uma casa de ensino formal, mas um verdadeiro “Centro Social”, um “Centro da Comunidade”.
15. Em seguida, as escolas precisam preocupar-se com os artesanatos, ensinando a seus alunos, sobretudo entre 12 e 15 anos, o grau elementar de uma profissão. Não queremos transformar as escolas primárias em profissionais, mas sim despertar nas crianças dessa idade o gosto, a vocação pelo trabalho.
16. Outro importante ponto é o da ORIENTAÇÃO PEDAGÓGICA. É imprescindível e urgente que o Ministério da educação prepara assistentes rurais para os Estados e municípios, assistentes esses que irão levar a cada escola rural até agora abandonada, não apensa novas ideias e novas técnicas, mas também folhetos, sementes e mudas, pequeno material agrícola, etc.
17. Não se compreende que, sendo a Educação Primária a mais importante para o país, tanto assim que é a única considerada “obrigatória” pela Constituição, e que abrange 5 milhões de alunos, não se compreende, repetimos, o alheamento do Ministério da Educação, nesse assunto vital para o país. Mesmo sem interferir na “direção” das escolas primárias, que cabe aos Estados e Prefeituras, o Ministério poderia um Departamento de Educação Primária, não um órgão burocrático a mais, mas dinâmico e atuante, que fornecesse orientação e assistência, oferecesse cursos para assistentes e supervisores, e, sobretudo, fornecesse material para o ensino rural, o mais abandonado do país. Naturalmente os cursos teriam que ser eminentemente práticos, dentro da realidade rural brasileiras, realizados fora das capitais, e lecionados não por medalhões, mas por educadores, que conheçam e vivam essa pobre realidade rural.
18. Enfim, é preciso clamar fortemente contra essa proliferação de GINÁSIOS URBANOS, que dia um crime multiplicar tais ginásios, que não preparam para cousa nenhuma senão (e muito mal) para o ingresso nas escolas superiores. Não é possível que nosso ensino secundário continue sendo apenas uma espécie de “curso de vestibular em 7 anos”. É imprescindível que o Ginásio, tanto quanto a Escola Primária, se adapte às condições de vida da comunidade, reflita os problemas do meio ambiente e colabore na sua solução. Note-se que não somos contra a “cultura humanística”, mas sim contra esse ensino totalmente abstrato, isolado da vida. Não deve haver um “ginásio único”; embora, em essência o curso seja o mesmo, a maneira de ministra-lo, e, sobretudo, as atividades dos alunos devem refletir as necessidades e aspirações do meio ambiente.

2. DESENVOLVIMENTO RURAL

19. Vem-se falando muito, ultimamente, e com razão, em uma “política do desenvolvimento”. Mas parece que esse desenvolvimento tem sido compreendido apenas como “desenvolvimento industrial”. Ora, é absolutamente errado cuidar da indústria com o abandono da agricultura. Se o Brasil se tornar uma grande potência industrial, para quem vai vender suas indústrias? Poderá concorrer, no mercado internacional com as indústrias americana, inglesa, alemã, etc? Poderemos vender produtos para a Ásia mais baratos que os daquelas potências?
20. Resta-nos, a nosso alcance, o mercado sul-americano, onde termos também que enfrentar fortes concorrentes e gastar enormes somas para conquistá-los, sem contar as dificuldades de transporte. No entanto, um detalhe que talvez muita gente não saiba: - a população brasileira atual já é igual á soma das populações de todos os países da América do Sul!
21. Mas para nossa tristeza e vergonha não existe um mercado brasileiro com capacidade de absorver nossa indústria porque nossas populações rurais são zeros econômicos! Como não produzem, não tem recursos para consumir. Assim, mesmo sem pensar no bem do homem do campo, sem pensar no progresso de nossa interlândia, e pensando apenas egoisticamente no progresso de nossa indústria e de nossas cidades, ainda assim precisamos trabalhar pelo progresso da zona rural. O desenvolvimento de nossa interlândia é uma questão de vida ou de morte para a nossa indústria. Ajudar o homem rural é obra de cunho humano e social, mas também é expressão de uma sábia política industrial!
22. Lembremos que a fabulosa produção industrial americana é consumida, sobretudo, no mercado interno do próprio país, graças à capacidade aquisitiva do homem comum americano. É raro o lavrador americano que não possui o seu jipe, o seu trator, o seu rádio, a sua geladeira, os seus aparelhos de eletricidade doméstica.
23. O desenvolvimento rural brasileiro está na dependência imediata e urgente de um PLANO NACIONAL DE ORGANIZAÇÃO AGRÁRIA. Preferimos esta expressão do que a de “Reforma Agrária”, porque não há até hoje, nenhuma organização da vida agrária brasileira, sendo pois, impossível, reformar o que não existe.
24. Além disso, a expressão “Reforma Agrária” sugere a quase todo mundo a visão do governo tomando ou desapropriando terras, para distribuí-las aos colonos. E se a Reforme fosse só isso, seria melhor jamais tentá-la, pois lançaria a agricultura brasileira num verdadeiro caos.
25. Com efeito, dar ao proletário rural a terra, mesmo que seja de presente, e nada mais, será condená-lo á mais negra miséria, muito pior do que ele a sofre agora, como assalariado. Pois de que vale a posse da terra, para quem não tem meios de explorá-la? – De que vale a terra sem sementes, adubos, arados, inseticidas, etc? Conhecemos milhares de pessoas, proprietárias de terras, que vivem na miséria, mal conseguindo realizar uma pequena lavoura de subsistência, exatamente porque não dispõem dos instrumentos de produção.
26. E além dos instrumentos de produção, é preciso organizar a distribuição, que compreende a criação de milhares de silos, armazéns, rede de transportes, usinas, cooperativas, etc. Aliás, o mais sério estudo que já se fez no Brasil sobre o problema da alimentação – o “Relatório Klein & Sacks” – salienta bem isso: que o problema da circulação é pelo menos tão grave quanto o da produção. Grande parte da produção de gêneros alimentícios (salienta o Relatório) se perde, devorada pelos insetos e pelos ratos, ou apodrece à espera de transporte, ou vai enriquecer os “atravessadores”.
27. Nessas condições, parece-nos um perigo tremendo falar em “distribuição de terras” antes que o governo tenha capacidade e desejo de resolver os problemas da produção acima citados. Do contrário, repetimos, iremos destruir os rudimentos de organização existente, baseados nas grandes fazendas, sem os substituir por cousa nenhuma.
28. O governo já possui uma dezena de órgãos de assistência ao campo, tais como o Ministério da Agricultura, com centenas de divisões e repartições especializadas, e outras centenas de postos espalhados pelo país inteiro; o Serviço de Crédito Rural, a Comissão Nacional de Política Agrária, o Banco de Crédito Cooperativo, além de dezenas de Institutos e Bancos. Perguntamos: - porque não se coloca tudo isso em funcionamento? Se há que reformar alguma cousa, vamos começar por reformar essas centenas de repartições, com milhares de funcionários e milhões de cruzeiros de verba, que pouco fazem pela agricultura brasileira!
29. Uma medida do mais alto valor social e econômico, que, por si só equivalerá a uma revolução construtiva no campo, será a facilitação do CRÉDITO AGRÍCOLA. Se nossos rurícolas tiverem crédito agrícola fácil e barato, eles, por si sós, mas com a orientação adequada, produziriam dez vezes mais do que hoje.
30. É imprescindível, porém que esse crédito seja levado ao produtor em sua fazenda ou sítio, em vez de se exigir, como hoje, que o rurícola abandone seus trabalhos, vá para a cidade, e, semanas a fio, lute, chore e implore para conseguir um crédito. Quando o consegue, e se consegue, já gastou uma boa parte dele nas despesas, viagens, estadias e presentes.
31. A Carteira de Crédito Agrícola do Banco do Brasil poderia, desde logo, criar um corpo de “supervisores de créditos”, que fossem ao interior oferecer os empréstimos, e depois orientassem o seu emprego. É, aliás, o trabalho que a ACAR, ANAR, ABCAR, etc, vem fazendo, em pequena escala, com bons resultados, e que precisaria ser estendido por todos os pontos do Brasil. E para isso bastaria que se concedessem menos empréstimos para a construção de arranha-céus na cidade e para as lojas de vendas a prestação, também nas cidades. Dentro de pouco tempo, com o aumento da produção agrícola, os lavradores teriam recursos, seriam maiores consumidores, e as próprias empresas e lojas de vendas à prestação teriam maior número de clientes e maiores lucros...
32. Ao lado do crédito agrícola, outra providência fácil é o estímulo e assistência para a criação de Cooperativas e de Associações Rurais por todos os municípios, as quais poderiam funcionar também como centros distribuidores de Crédito Rural, acima citado. As cooperativas, como boa orientação e assistência poderiam ser também os centros dos tratores, máquinas, caminhões, etc, que serviriam a toda a coletividade. Tal socialização dos meios de produção, sem guerra nem sangue, alcançaria sem dúvida muito maiores resultados. E por fim, as Cooperativas poderiam trazes os produtos de seus cooperados para vendê-los diretamente nos grandes centros consumidores, eliminando-se, assim, os gananciosos intermediários.
33. Essa reforma progressiva, se assim a podemos chamar, seria completada com a multiplicação de Colônias, situadas em grandes tratos de terras devolutas ou adquiridas, onde os rurículas se estabeleceriam para realizar o trabalho cooperativo, com a assistência técnica e material do governo. Este é, se não nos enganamos, um dos pontos do programa do INIC, mas a verdade é que suas Colônias e Núcleos Coloniais estão muito longe de atingir suas finalidades.
34. Sabemos que nessa grandiosa instituição de trabalho, de estudo e de cultura, que é a ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA, foi apresentada há dois anos, um plano no sentido de fazer a verdadeira Reforma Agrária, a Reforma construtiva e evolutiva. Sabemos também que ali se propôs a criação de um órgão de cúpula, destinado a fazer funcionar a dezena de órgãos do governo já existentes, e que simplesmente não funcionam, ou trabalham isoladamente, desperdiçando tempo, trabalho e dinheiro. Realmente, os órgãos para resolver os problemas do campo brasileiro já aí estão todos: a Carteira Agrícola do Banco do Brasil, as centenas de repartições inoperantes do Ministério da Agricultura, o INIC, a Comissão de Política Agrária, o Serviço Social Rural, a Campanha de Educação Rural do Ministério da Educação... Só falta isso: uma força realmente forte, capaz de coordená-los e impulsioná-los.
35. O fato é que não podemos continuar a assistir, parados, a essa constante degradação da vida rural brasileira, a esse êxodo dos campos, enquanto na cidade os preços sobem minuto a minuto, e as Comissões oficializam os aumentos, sem compreenderem que a solução para o problema não é fazer tabelas de preços, mas sim multiplicar a produção. Não tenhamos dúvidas: ou nós nos mostramos à altura da grave conjuntura nacional, encaminhando a solução de seus problemas rurais, ou estes, se agravando dia a dia, terminarão por gerar as mais terríveis convulsões sociais.

3. PROTEÇÃO Á INFÂNCIA

36. Outro problema que estamos vendo agravar-se a cada dia é o da infância e da juventude desassistida, sem que se conheçam as providências oficiais para atalhar o mal. Esclarecemos que englobamos naquela expressão não apenas as crianças órfãs e as que perambulam pelas ruas, dormindo nos vãos das portas e nos bancos das praças, mas também aquela infância e juventude, talvez ainda mais infeliz, que tem pai e mãe, às vezes até remediados ou ricos. O que se costumou chamar de “juventude transviada” é muito mais o grupo dos rapazes e moças que tem pais abastados, mas que vive igualmente abandonado.
37. O assassinato daquela pobre mocinha, ocorrido em Copacabana, que tanto abalou a sociedade brasileira, veio alertar a todos nos sobre a gravidade da situação, gravidade tanto maior quanto se procura inocentar os culpados e colocar uma pedra sobre o caso.
38. Além das causas sociais e econômicas, que todos nós conhecemos, e que produzem a infância desassistida, precisamos chamar a atenção das autoridades para a responsabilidade de sistema escolar vigente: com efeito, a falta de escolas, denunciada logo ao inicio de nossas palavras, fez surgir o malfadado sistema de “3 turnos”, em que o aluno permanece na escola por apenas 3 horas por dia. E no resto do dia, não tendo o que fazer, perambula pelas ruas, pervertendo-se. Da mesma forma, a Escola Primária, com seu curso de 4 ou 5 anos, deixa a criança abandonada a partir dos 12 anos, idade em que ainda não pode começar a trabalhar, ficando disponível para o mau caminho. É tão sensível esse fenômeno que os educadores já lhe deram um nome: - Hiato nocivo, correspondente aos 3 anos em que o menino já deixou a escola e ainda não pode começar a trabalhar.
39. Duas soluções se nos afiguram urgentes para o problema: uma no interior e outra nas cidades. Na zona rural devemos multiplicar as escolas-granja, as fazendas-escola, que, em sistema de internato, ao lado do ensino comum das letras desenvolvem todas as atividades de agricultura e de indústrias rurais, bem como, os vários artesanatos. Sabemos que o sistema produz os melhores resultados possíveis, porque não somos teóricos no assunto: criamos e dirigimos, em Minas Gerais, as escolas “Caio Martins”, no gênero fazenda-escola, que tem recebido a aprovação de educadores brasileiros e estrangeiros.
40. A segunda solução é criar, nas cidades, se possível, em cada bairro, um CENTRO SOCIAL, ou CENTRO DE COMUNIDADE, onde as crianças e os jovens se reúnam para brincar, jogar, conversar, ouvir música, fazer teatro, grupos de discussão, etc. Agora, que estão começando a surgir no Brasil as “ASSOCIAÇÕES DE AMIGOS” da cidade ou do bairro, seria fácil para cada uma organizar um “CENTRO DA JUVENTUDE” anexo.
41. Nesse capítulo da proteção à infância impõe-se também uma severa repressão às publicações infantis inescrupulosas, que fazem a apologia da força, da guerra, e do crime, bem como aos programas de rádio de moral duvidosa, ou simplesmente embrutecedores, quando poderiam colaborar de maneira relevante na cultura da nossa juventude.

4. REVISÃO DOS PROGRAMAS DO SÃO FRANCISCO

42. Na qualidade de representante da região san-fransciscana, não podemos deixar de lado tão importante problema. É necessário e urgente que se revejam os programas de recuperação do vale do São Francisco. Nesses 12 anos de vigência do texto constitucional, que determina assistência federal ao Vale, bilhões de cruzeiros foram gastos. Precisamos ver até que ponto foram satisfeitas as necessidades da região.
43. É necessário criar o “Fundo do São Francisco”, com patrimônios e verbas permanentes, destinados a custear os serviços do Vale ao lado das verbas federais. Esse Fundo poderia ser formado, entre outros, com recursos provenientes de parte da venda de energia elétrica das empresas que se constituem no Vale, ajudadas com verbas constitucionais a ele destinadas. Aliás, quanto mais o Vale progredir, tanto mais lucrarão essas Empresas.
44. O futuro Fundo não será contra o auxílio a cidades, que se encontrem fora da região geo-econômica do São Francisco, mas naturalmente terá que dar preferência a auxiliar as desta região
45. É imprescindível criar no Vale do São Francisco, Fazendas-Cooperativas, para a fixação e desenvolvimento das populações ribeirinhas, que até agora pouco lucraram com os trabalhos ali realizados.
46. Por outro lado, precisa ser dada muito maior ênfase ao problema educacional no Vale. Obras de engenharia são necessárias, mas não resolverão os problemas, se, ao mesmo tempo, não se cuidar do homem, da valorização do elemento humano que aí habita. Faz-se mister, pois, um grande programa de educação para o Vale, compreendendo escolas primárias, fazendas-escolas, artesanatos, escolas normais rurais e centros de comunidade.
47. Ainda com relação ao soerguimento do elemento humano, precisaríamos dar maior atenção aos problemas de saúde, da habitação, do treinamento agrícola, na região do Vale. Precisamos encorajar, estimular, orientar essas populações ribeirinhas, pois do contrário, tanto trabalho e tanto dinheiro gasto terão sido em pura perda.