terça-feira, 20 de dezembro de 2011

1952

POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Belo Horizonte, em 16 de Abril de 1952.
Ilmo. Sr. Prof. Benigno Di Tullio
M. D. Lente de Antropologia Criminal da Universidade
Roma

Atenciosas Saudações,

Um espetáculo para os olhos e uma caudal de estímulo para o espírito proporcionou-nos a leitura do vosso substancioso trabalho: A POLÍCIA, ORGANISMO DE PROTEÇÃO SOCIAL, inserto na REVISTA DE IDENTIFICAÇÃO E CIÊNCIAS CONEXAS que com grande atraso nos veio ter às mãos ao iniciar-se este mês. Nimbado ainda da aura dos nossos sólidos argumentos otimistas, relativos ao problema da reforma social que hoje preocupa os intelectos bem intencionados, permito-me trazer ao talento do mestre os aplausos da nossa admiração.
Posto seja esta a primeira vez que nos surge a oportunidade de exteriorizar e dar-vos a conhecer quanto comungamos da doutrina que tão bem explanais, não foi surpresa verificar no artigo em causa, a identidade ora testemunhada, eis que são por demais difundidos no congestionado ambiente do após-guerra os verdadeiros paradigmas para os que se propõem - embora cortinados pela abnegação – pugnar por um mundo mais ameno e propício à consecução da felicidade humana. Como, portanto, não constituiu vosso artigo uma simples apresentação de estréia, dado ser sobejamente conhecido em nossa terra o conjunto de vosso pensamento vivo, sentimo-nos à vontade, sem constrangimento, para beber a lógica da articulação magnífica que dali fluía. Soube-nos bem, como vivificante “água de Castália” tudo quanto a fonte brotou, principalmente porque o assunto tratado falava-nos de perto ao sentimento de policiais que tem em mira atingir a estas cumiadas de onde grandiosas paisagens se descortinam. Pretensão um pouco temerária, talvez, para quem, como nós, no estágio atual, vamos ainda às apalpadelas, rebuscando no coração a Força que há de gerar para o advento do Bem. Dentes de CÁDMOS, justificando a criação unicamente com o mérito de procurarmos o próprio desaparecimento pela não necessidade de nossa existência através da abolição do CRIME, também acredito na recuperação moral da SOCIEDADE não apenas pela direta repressão à delinqüência consumada, pois, deve nosso papel ser mais educativo e preventivo do que formulado em termos de expedições punitivas. Reconhecemos que castigar o criminoso e escarmentá-lo é paliar simplesmente, quando a solução do problema está em nos mantermos como Agentes do CONTROLE SOCIAL, vigiando-lhe os atos dissociadores, talvez, o critério primitivo como terá sido elaborado o organismo policial dos primeiros clãs.
Não poderiam mesmo nossos cérebros atuais, libertos já do antigo crepúsculo mental que os cegava, conceber a POLÍCIA sem o imperativo de ver secar na fonte o impulso criminoso, posto que, atuar de maneira diversa seria admitir seu próprio fracasso, como o pretender limpar “Cavalariças de Áugias”.
Admirável, portanto – e razão de construtivo envaidecimento para nós – e verificarmos que aqui vimos, há anos, neste rincão de latinidade tropical, trabalhando sobre o mesmo meridiano em que tendes espalhado e disseminado uma cultura sociológica considerável temperada com o brilho invulgar de vosso conhecimento humanístico. Igualmente temos compreendido – nós da Pólicia Militar de Minas – que a POLÍCIA há de ir ao âmago da questão, há de amoldar-se à família, há de ser ministrada na Escola, a fim de que os indivíduos possam ser salvos, um a um, pela própria consciência de sua responsabilidade para com o ambiente social onde atuam. São-nos sumamente gratos e preciosos os conceitos de caráter sócio-policial que emitiste em vossa abalizada exposição doutrinária. Substancialmente é o que temos procurado desenvolver entre nós, modesta, singelamente, a despeito de até então ainda não iluminados de vossas lúcidas concepções sobre o papel da POLÍCIA que esse vosso ângulo só agora nos foi dado entrever.
E quão felizes somos com a constatação dessa singular e coincidente identidade.
Através de dois núcleos rurais onde elementos de nossa Polícia Militar recuperam lentamente a criança ensinando-a a cultivar a gleba para que ela aprenda também que “o melhor coração é o que mora mais perto da terra”, encetamos a batalha pelo reajustamento do Homem, mostrando-lhe que o verdadeiro policiamento, é obtido pela patrulha constante de uma consciência bem formada e bem orientada. Nesses núcleos, o de Esmeraldas e o de Pirapora, intentamos preparar a primeira geração de homens forjados ao calor de um ideal, e esperamos, e se Deus for servido, assistir ainda à verificação do resultado que naturalmente aguardamos com otimismo.
Aproveitando a oportunidade junto a esta, dois trabalhos nossos realizados com a intenção de esclarecer nosso ponto de vista relativamente ao papel da POLÍCIA no plano da Assistência Social. Um deles, produto de palestra feita em São Paulo. Outro contendo em maiores detalhes o plano seguido como diretriz da ESCOLA “CAIO MARTINS”, com seus núcleos rurais, estabelecimento que colima o triplo objetivo de:
a) Favorecer o ambiente rarefeito das glebas incultas, valorizando a energia dos habitantes ali fixados, com a conseqüente elevação do padrão de vida da região, criando ao mesmo tempo ambiente que compatibilize o Homem com o trabalho.
b) Amparar a criança internada e também a que reside na zona de gravitação da Escola, de modo que menor desamparado se preste, ao depois, a prática do benefício da vizinhança, mediante os recursos da instituição em aliança com a técnica apreendida.
c) Tornar-se motivo educacional da atividade humana, com a consciência de sua responsabilidade pela tranqüilidade e ordem pública, proporcionado pelo trato diário da gente rural com os internados e com os componentes da Corporação ali destacados.
Além do mais, assegura-se em tais estabelecimentos a alfabetização de menores que se agrupam em LARES, proporcionando-se-lhes a freqüência a outros aprendizados que os capacitarão à luz pela vida na idade adulta, tudo isso não se levando em conta o considerável acervo de sociabilidade e mútua compreensão que terão por legado conseqüente à existência na atividade cotidiana comum.
Claro que nos achamos ainda no início deste empenho; mas contamos poder disseminar num futuro muito próximo, outros núcleos semelhantes sobre novas extensões do imenso território do Estado de Minas Gerais colimando os mesmo objetivos que povoam os atuais núcleos em efetiva atividade.
Enfim, os modestos trabalhos que vos oferecemos poderão dar uma idéia mais ampliada do afã de boa vontade que nos impulsiona.
Certo, vossa benevolência de mestre seguro, afeito ao panorama universal do fascinante problema, saberá perdoar as lacunas facilmente visíveis ao exame de olhos mais argutos, absolvendo-nos do pecado de pretender tanto. E, nesta convicção, renovando nossos aplausos ao admirável e consolador artigo publicado na REVISTA DE IDENTIFICAÇÃO, citada aqui ficamos aguardando outros luminosos conceitos emanados de vossa doutrina sociológica tão do nosso sabor.
Cordialmente, o admirador sincero,

(Manoel José de Almeida, Ten. Cel.)
PRESIDENTE DO CONSELHO DIRETOR DA ESCOLA “CAIO MARTINS”

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